Afinal, o que é a loucura? Essa pergunta dá o tom do espetáculo “Em Busca de Judith”, que faz sua temporada de estreia no Itaú Cultural entre os dias 5 e 15 de maio, com sessões de quinta a sábado, às 20h e, aos domingos, às 19h. Os ingressos são gratuitos e podem ser reservados direto pelo site do Itaú Cultural.
Para quem não estiver em São Paulo no período, é possível entrar em contato com a obra de outra maneira. Será exibida online a peça-filme que serviu de base para a montagem presencial, filmada em pavilhões da antiga Colônia Juliano Moreira, no Rio de Janeiro. No online, “Em Busca de Judith” integra o Palco Virtual Ancestralidades e poderá ser assistido no Youtube do Itaú Cultural – www.youtube/itaucultural.
O espetáculo estreia no Mês da Luta Antimanicomial. A data celebra a mudança na forma de lidar com a saúde mental. Chamado de Reforma Psiquiátrica, o movimento iniciado na década de 1970 foi responsável por deslocar dos hospitais para a comunidade os tratamentos para os transtornos mentais, criando dispositivos que são fundamentais para a assistência e a luta contra os estigmas, como os CAPS e as residências terapêuticas.
Idealizado por Jéssica Barbosa e Pedro Sá Moraes, o trabalho resgata uma história familiar muito importante para a atriz. Até os 32 anos, a artista acreditava que a sua avó paterna, Judith, havia morrido em um acidente de carro, quando seu pai ainda era um bebê. No entanto, a realidade era bem diferente.
Na verdade, a matriarca foi internada compulsoriamente por seu marido em um hospital psiquiátrico, aos 28 anos. Ela passou 13 anos na instituição, até sua morte, aos 42. Quando Jéssica descobriu esse fato, sentiu que era sua missão descortinar essa história. Afinal, era injusto mais uma jovem mulher preta, mãe de cinco filhos, ter sua voz silenciada de uma maneira tão brutal. “Meu avô nunca se casou com ela no papel. Na verdade, ele a traiu e se casou com uma mulher branca. Desconfiamos que ela enfrentou uma depressão pós-parto, mas não havia esse diagnóstico nos anos 40”, comenta Jéssica.
O desenvolvimento da peça começou em 2018, quando Jéssica e Pedro ingressaram na residência artística do Museu Bispo do Rosário, chamado de Programa Casa B. A dupla pesquisou o universo da saúde mental, a história de Judith e sua interface com a arte durante três anos. Nesse período, trocaram experiências com os artistas residentes do Ateliê Gaia, além de acessar vários materiais de pesquisa e contar com o apoio da curadora pedagógica do Museu Bispo do Rosário Diana Kolker, orientadora durante a construção desse trabalho.
Enquanto construía a dramaturgia, a atriz debruçou-se sobre livros como “Holocausto brasileiro” (2013), da jornalista Daniela Arbex, sobre o Hospital Colônia de Barbacena, e “Mulheres e Loucura: Narrativas de Resistência” (2020), de Melissa de Oliveira Pereira. Além disso, promoveu debates em seu canal do YouTube com o psicólogo Lucas Veiga, com a psicóloga e doula Luiza Ferreira e com a própria Diana Kolker.
“Precisamos racializar a história da luta antimanicomial, especialmente no caso das mulheres, que sempre escutam que estão ficando loucas. E pensarmos sobre saúde mental em uma época em que estamos generalizadamente doentes, com insônia, bruxismo, burnout e depressão, é fundamental. Afinal, o que é a loucura?”, completa.
Espetáculo como ebó
Segundo Jéssica, “Em Busca de Judith” é muito mais do que um espetáculo teatral. A conexão espiritual – e até ancestral – dela foi tão grande, ao longo do processo, que é quase como um ebó, ritual de oferenda aos Orixás para equilibrar diferentes aspectos da vida e até desfazer nós.
Outro aspecto importante da montagem é a música. Com trilha sonora ao vivo executada por Alysson Bruno (percussão e voz) e Muato (voz, baixo, guitarra e violão), a peça também é embalada pela potente voz de Jéssica Barbosa, que interpreta canções carregadas de afeto e emoção. A direção musical é de Pedro Sá Moraes. “As canções são momentos de reflexão, de respiro. Ao mesmo tempo, essa musicalidade conversa com a pesquisa de doutorado do Pedro, que investiga o quanto a música traz um ritmo para a fala – e como se constrói um tipo de espetáculo em que o texto é atravessado pelas canções”, comenta a idealizadora. Há também muitas referências a elementos relacionados à estética negra, como a capoeira e a própria dança executada em cena. “Nossa historiografia pessoal se dá no coletivo. Por isso, tem muita coisa do coletivo que se dá pela busca pessoal. O quintal é o mundo. Se houve X pessoas internadas no manicômio Y, todos temos responsabilidade sobre isso”, acrescenta.
Para os espectadores mergulharem nessa realidade dos hospitais psiquiátricos, serão projetados trechos da peça-filme durante o espetáculo presencial. É a chance de conhecer os escombros da Colônia Juliano Moreira e dar um significado para aquilo.
Sinopse
Até os 32 anos, Jéssica Barbosa acreditava que Judith Alves Macedo, sua avó paterna, havia falecido em um acidente de carro. A história que lhe era contada desde a infância ganhou uma reviravolta quando a atriz se deparou com uma fotografia num livro e ouviu um relato familiar, gatilhos que dispararam nela a busca pela história real de Judith.
A mulher negra, mãe de cinco filhos, fora internada compulsoriamente em um hospital psiquiátrico, onde permaneceu até a sua morte, em 1958. É sobre as buscas e descobertas dessa história, permeada pelo silenciamento das vozes femininas e questões que atravessam o sistema manicomial que trata “Em Busca de Judith”, espetáculo idealizado por Jéssica e Pedro Sá Moraes, que também assina a direção.
FICHA TÉCNICA
Idealização e dramaturgia: Jéssica Barbosa e Pedro Sá Moraes
Atriz: Jéssica Barbosa
Músicos/performers: Alysson Bruno e Muato
Direção e direção musical: Pedro Sá Moraes
Supervisão de direção e criação da iluminação: Fabiano de Freitas Dadado
Direção de movimento e preparação corporal: Leandro Vieira
Figurino: Cris Rose
Cenografia: Ana Rita Bueno
Produção: Corpo Rastreado
Assessoria de Imprensa: Canal Aberto – Márcia Marques.
Serviço:
Presencial
“Em Busca de Judith”
De 5 a 15 de maio, de quinta a sábado, às 20h, e, aos domingos, às 19h
Duração: 70 minutos Classificação: 12 anos
Local: Itaú Cultural – Av. Paulista, 149 – Bela Vista – São Paulo (SP)
Ingresso: grátis (os ingressos devem ser reservados pela INTI – acesso pelo site www.itaucultural.org.br).
Formato peça-filme no Palco Virtual Ancestralidades
“Em Busca de Judith”
A programação do Palco Virtual Ancestralidades faz link com a plataforma Ancestralidades https://www.ancestralidades.org.br, lançada em novembro de 2021 pelo Itaú Cultural e a Fundação Tide Setubal. Neste ambiente digital, voltado às heranças culturais do Brasil, o público poderá conferir texto reflexivo sobre o espetáculo.
De 1º de maio, a partir das 19h, até às 23h59 do dia 29 de maio, sob demanda
Duração: 60 minutos Classificação: 12 anos
Local: Youtube do Itaú Cultural www.youtube/itaucultural
Ingresso: grátis.
(Fonte: Canal Aberto Comunicação)