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Cia de Teatro Acidental apresenta vídeos do processo da sua próxima peça

São Paulo, por Kleber Patricio

Processo – Culpa 1. Fotos: divulgação.

Dando continuidade ao projeto Trilogia Afetos Políticos: Culpa, a Cia de Teatro Acidental apresenta dois experimentos cênicos em vídeo. Os vídeos fazem parte do projeto em que o grupo compartilha com o público a pesquisa para a sua próxima peça, com uma programação iniciada em janeiro e que também inclui bate-papos e cursos. Todas as atividades são online e gratuitas, realizadas graças à Lei Aldir Blanc de Apoio à Cultura, da Secretaria de Cultura da Cidade de São Paulo. Os vídeos serão exibidos no site da Cia a partir de 3 de abril, com lançamentos sempre aos sábados, a partir das 20 horas.

Trilogia Afetos Políticos: Culpa encerra um projeto maior da Cia de Teatro Acidental, iniciada com O que você realmente está fazendo é esperar o acidente acontecer (2014), que investigou o tema do ódio na ascensão da extrema-direita brasileira, e continuada com E o que fizemos foi ficar lá ou algo assim (2019), que abordou o medo que faz certa classe média, seja ela conservadora ou progressista, erguer muros para separá-la de outros ameaçadores. Na montagem que fecha a trilogia, o grupo investiga a culpa como afeto imobilizador, mas muito evocado por uma esquerda que se sente impotente diante de uma realidade cada vez mais imutável e, por isso, se abriga em um moralismo estéril.

Processo – Culpa 2.

Os vídeos serão apresentados em duas séries e unem os estudos que o grupo fez a partir do texto A decisão, de Brecht, que é a base da terceira parte da Trilogia dos Afetos Políticos.

O lado A é resultado do mergulho do grupo no texto de Bertolt Brecht. Na peça, de 1930, um grupo de agitadores viaja da URSS para a China para levar “os ensinamentos dos clássicos” e tentar impulsionar ali uma Revolução. Porém, um Jovem Camarada, idealista e impaciente, põe em risco o movimento e a vida dos seus colegas, precisando ser morto. Depois de tomada essa difícil decisão, os Agitadores precisam explicá-la ao Coro de Controle, reencenando os acontecimentos.

Para Brecht, esse roteiro seria uma oportunidade para um grupo de aprendizes – todos ao mesmo tempo atores e espectadores, sem divisão – experimentarem todos os papéis da história e desenvolverem suas próprias posições em relação a ela.

Para a Cia de Teatro Acidental, com os integrantes presos cada um em sua casa há mais de um ano, o texto deu a oportunidade de refletir sobre a transposição do gesto teatral brechtiano para o meio do vídeo, pensando a própria edição, o corte e a montagem, como um gesto – muito inspirados pela estética dos vídeos caseiros possibilitados pelas novas tecnologias e aplicativos, como por exemplo o TikTok.

Já o lado B traz leituras da dramaturgia criada pelo grupo e que ainda está sendo trabalhada. Intitulada E se a porta cair seguiremos sentados apenas mais visíveis, a peça está sendo escrita por Artur Kon a partir das leituras e discussões sobre a obra brechtiana. São discursos de figuras abstratas: um “homem bom”, uma “pessoa honrada”, um “homem branco” e uma “mulher negra”, alguém “que pensa no grande” e alguém “que pensa no que é pequeno”. Todos explicam e defendem suas posições em uma sociedade sem espaço para formas coletivas, verdadeiramente políticas, de enunciação.

No lado B, a Acidental teve a contribuição das artistas da Bruta Flor Filmes, que souberam aproveitar ao máximo a locação escolhida para as gravações: um apartamento em reforma. Inteiro quebrado, revelando sua estrutura, o cenário lembra algo que Brecht disse uma vez: que ele gostava dos prédios em ruínas, pois em alguma medida se confundem com os edifícios em construção. “De modo semelhante, em nosso processo, a desconstrução da obra do dramaturgo alemão é idêntica à construção de uma nova obra. A ideia é o público poder comparar esse duplo gesto que atinge, simultaneamente, o material que nos inspirou e o material que criamos a partir dele, para acompanhar nossa reflexão sobre como a culpa e o julgamento moralista se tornaram dominantes nas discussões sobre política atualmente, bloqueando os caminhos que levariam a alguma ação real e eficaz”, explica Artur.

Curso | Também em abril, a Acidental realiza o último curso da série iniciada no começo do ano. Escrever peças sem escrever nada: oficina de escrita dramatúrgica será ministrado pelos integrantes da Cia de Teatro Acidental. Será uma oficina prática trazendo alguns procedimentos dramatúrgicos de colagem e adaptação empregados crescentemente na dramaturgia contemporânea e também na Trilogia dos Afetos Políticos.

Sobre a Cia de Teatro Acidental | A Cia de Teatro Acidental completou em 2020 dez anos de atividade pesquisando cenicamente possibilidades e contradições, formas e figuras da coletividade: a organização grupal não só como estrutura e modo de produção, mas também tema e estética. Além de encenar peças de autores como Brecht (Mahagonny, dir. Marcelo Lazzaratto, ProAC circulação 2010), Ionesco (O rinoceronte, dir. Carlos Canhameiro, produção SESI-SP 2011) e Elfriede Jelinek (Peça Esporte, dir. Clayton Mariano, ProAC produção 2014-5), trabalha cada vez mais na criação colaborativa de dramaturgias próprias, para pensar as especificidades do nosso contexto no difícil tempo presente. Assim nasceu a Trilogia Afetos Políticos, com O que você realmente está fazendo é esperar o acidente acontecer (2014) e E o que fizemos foi ficar lá ou algo assim (2019). A terceira peça está atualmente em elaboração.

Trilogia Afetos Políticos: Culpa – Programação gratuita e online.

Locais – Canais virtuais Oficina Cultural Oswald de Andrade https://www.facebook.com/OficinasCulturais e https://www.youtube.com/channel/UCx4ySlsHp1HfVZcwbvulpAQ e https://www.youtube.com/oficinasculturaisdoestadodesaopaulo e no site da Cia de Teatro Acidental (https://www.teatroacidental.com.br/)

A Cia de Teatro Acidental é Artur Kon, Chico Lima, Mariana Dias, Mariana Otero e Mariana Zink. A orientação do processo dessa nova peça é de Maria Tendlau.

Curso:

De 8 a 29 de abril

Com Artur Kon e Cia de Teatro Acidental

Tema: Escrever peças sem escrever nada: oficina de escrita dramatúrgica

Horários – Sempre às quintas, entre 19 e 21 horas.

Inscrições – Até 4 de abril, pelo site das Oficinas Culturais (https://poiesis.org.br/maiscultura/oficinas_culturais/escrever-pecas-sem-escrever-nada/) .