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Pinakotheke São Paulo apresenta exposição Frans Krajcberg (1921-2017) – “(…) ao acordar a natureza estava preta e branca” em diálogo com Luiz Garrido

São Paulo, por Kleber Patricio

Foto: divulgação.

A Pinakotheke São Paulo vai inaugurar em 18 de março de 2023 a exposição Frans Krajcberg (1921-2017) – “(…) ao acordar a natureza estava preta e branca”. As vinte obras – esculturas, pinturas e trabalhos em papel, como seus relevos – de Frans Krajcberg estarão em diálogo com o ensaio fotográfico do artista feito em 1996 por Luiz Garrido (1945), em Nova Viçosa, Bahia, onde Frans Krajcberg morava e trabalhava.

Com planejamento e organização de Galciani Neves e Max Perlingeiro, a exposição é uma realização da Pinakotheke Cultural em colaboração com a Associação de Amigos de Frans Krajcberg. “Ele foi um precursor na defesa do meio ambiente. Krajcberg se revoltou com a destruição da natureza que conheceu em suas viagens pelo país e sua indignação não esmoreceu até o fim de sua vida, aos 96 anos”, destaca Marcia Barrozo do Amaral, presidente da AmaFrans.

Foto: divulgação.

O público poderá ver ainda Krajcberg em ação em Nova Viçosa, indo ao mangue buscar material sobre o seu trabalho, rindo e conversando, em um vídeo de 10 minutos que será exibido em looping. O registro feito por Luiz Garrido e seu assistente Carlos (Kaká) Hansen, em 1996, com uma filmadora Video8, analógica, foi restaurado, digitalizado e editado especialmente para a exposição.

Lançamento do livro | Na abertura da exposição será lançado o livro homônimo, bilíngue (port/ingl), com 172 páginas e formato 21 x 27 cm, com imagens das obras de Frans Kracberg e as fotografias de Luiz Garrido. Os textos são de Marcia Barrozo do Amaral, presidente da Associação de Amigos de Frans Krajcberg; Galciani Neves, Max Perlingeiro, Bené Fonteles, Jaider Esbell, e Pierre Restany – um dos autores do célebre “Manifesto do Rio Negro doNaturalismo Integral”, escrito em 1978 também por Frans Krajcberg e Sepp Baendereck (1920-1988) – uma entrevista de Advânio Lessa dada a Valquíria Prates e uma cronologia do artista.

“… Ao acordar, a natureza estava preta e branca”

Marcia Barrozo do Amaral ouviu de Krajcberg a frase “Sonhei, e ao acordar a natureza estava preta e branca. (…) O branco vela o negrume das arvores queimadas”. Ela registrou na memória para nunca esquecer. Ela conta ainda que ouviu incontáveis vezes Krajcberg dizer “A estética não me basta. É necessário que a obra possa ecoar e reverberar o grito que trago no peito”. Judeu de origem polonesa, ele chegou ao Brasil em circunstâncias trágicas, aos 27 anos, buscando superar os horrores da Segunda Grande Guerra, conflito no qual esteve pessoalmente envolvido e que lhe roubou a família, dizimada nos campos de concentração. “Aqui, neste país tropical, de natureza exuberante, Krajcberg encontrou mais do que inspiração para sua obra”, diz Marcia. “Além de excepcional artista – premiado em importantes Bienais, como Veneza e São Paulo, e com obras nos acervos de importantes museus, como o Beaubourg, em Paris – Krajcberg foi um combatente, um ativista ambiental, quando ainda pouquíssimos se sensibilizavam pelo tema e por suas drásticas consequências. Impossível examinar suas esculturas, pinturas e relevos sem a conexão profunda e indissociável com a causa que o artista abraçou, integral e decididamente ao longo de sua vida. Nesse caso, não há forma dissociada do conteúdo, do contexto em que fora recolhido o suporte natural”, afirma. Para ela, a obra de Krajcberg “é o alerta de um pioneiro na defesa e preservação de nossos biomas naturais e dos remanescentes povos originários e uma exortação dolorosamente atual ante a colapsada fiscalização e controle ambiental sob responsabilidade do Estado brasileiro”.

Frans Krajcberg (1921-2017) – “Raízes” – circa 1983. Foto: Jaime Acioli.

Max Perlingeiro diz que “a produção de Krajcberg encerra um impressionante libelo pela preservação do patrimônio ambiental, bem de uso comum do povo e consagrado à subsistência e proveito da humanidade”.

A exposição esteve na Pinakotheke Cultural Rio de Janeiro de 25 de julho a 27 de agosto de 2022.

Luiz Garrido por Frans Krajcberg

Frans Krajcberg disse sobre a obra de seu amigo Luiz Garrido: “A técnica não é tudo e, sim, a participação do artista na obra. Na fotografia me impressiona essa relação do fotógrafo com a máquina, a maneira como ele cria, a percepção da luz, o enquadramento da imagem, o momento exato do clique. Conheci o Garrido, em Paris, em 1968, quando ele estudava fotografia, e nossa amizade desenvolveu-se a partir dos muitos encontros, nos quais sempre discutíamos bastante sobre o assunto. Depois de alguns anos, descobri, já no Rio de Janeiro, o fotógrafo Garrido e fiquei impressionado com o seu trabalho. Um artista captando, com a máquina fotográfica, uma imagem muito própria, criando sua obra. Isso me impressiona sempre, o talento e o desejo de criar uma obra própria, o trabalho de pesquisa, o domínio da técnica como instrumento e não como fim. A máquina não é tudo, o artista sim. Os retratos, foco de seu atual interesse e que fazem parte dessa exposição, são a síntese dessa união entre técnica, luz, imagem, percepção de um momento fugaz de um olhar, um gesto, uma postura que dizem algo além da imagem retratada. Em resumo, é a participação, por inteiro, de artista, em sua obra, são os retratos do ponto de vista Garrido, é a fotografia como forma de expressão, arte, uma obra que foi cuidadosamente elaborada e que transcende a imagem retratada”.

Sobre Frans Krajcberg

Foto: divulgação.

Frans Krajcberg foi escultor, pintor, gravador e fotógrafo. Autor de obras que têm como característica a exploração de elementos da natureza, destaca-se pelo ativismo ecológico, em que associa arte à defesa do meio ambiente. Em toda sua trajetória, participou seguidamente de exposições em importantes museus no Brasil e no exterior e foi premiado várias vezes. Participou de Bienais em vários países – França, Cuba, Uruguai. Foi premiado na Bienal de Veneza, em 1964, integrou muitas edições da Bienal Internacional de São Paulo, desde a primeira, em 1951, e continuamente as de 1953, 1955, 1957, 1961, 1963, 1977, 1979, 1989 e 2000.

Frans Krajcberg nasceu em 12 de abril de 1921 em Kozienice, na Polônia, filho de um modesto comerciante e de mãe militante comunista. É o terceiro de cinco filhos: dois irmãos e duas irmãs. Por ser judeu, sofre preconceitos e perseguições pelos nazistas. Toda sua família foi morta no Holocausto. Preso, consegue fugir. Integra-se ao exército russo, aquartelado na Polônia, seguindo para Vilna, de onde é enviado à Romênia. Depois de tentar ingressar sem sucesso na Escola de Belas-Artes de Vitebsk, desloca-se para Leningrado, onde começa a estudar engenharia hidráulica e belas-artes na universidade, em1940. Em 1941, quando os alemães invadem a URSS, Krajcberg integra-se à Resistência Polonesa, incorporando-se a seguir ao exército polonês, apoiado pelos russos. Com a patente de oficial, ajuda a construir pontes de emergência nas frentes de batalha. No fim da guerra, vai pra Alemanha, estuda com Willi Baumeister (1889-1955), professor da Bauhaus, na Escola de Belas-Artes de Stuttgart. Expõe no Centro de Refugiados da cidade. Em 1948, migra para o Brasil aos 27 anos, incentivado pelo amigo e também artista plástico Marc Chagall. Sem dinheiro e sem saber falar português, dorme ao relento durante alguns dias na praia do Flamengo, no Rio de Janeiro, então partindo para São Paulo, onde, recomendado por Francisco Matarazzo, é contratado para trabalhar como operário na manutenção do Museu de Arte Moderna. Expõe duas pinturas na I Bienal Internacional de São Paulo, em 1951,época em que trabalhava na montagem da exposição no pavilhão Trianon, como funcionário do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Participa do I Salão Paulista de Arte Moderna, na Galeria Prestes Maia, em São Paulo. Expõe individualmente na Galeria Domus, em São Paulo. Em 1952, por indicação de Lasar Segall, que dele comprara um desenho, vai trabalhar como engenheiro-desenhista nas indústrias de papel Klabin em Monte Alegre, no Paraná. Contudo, abandona esse emprego para se isolar nas matas para pintar. Ali, no interior do Paraná, Krajcberg testemunha desmatamentos e queimadas nas florestas. Participa da II e da III Bienal de São Paulo e, em 1956, se muda para o Rio de Janeiro, onde produziu os seus primeiros trabalhos, fruto do contato direto com a natureza. Em 1964, criou suas primeiras esculturas com madeiras mortas. Realizou diversas viagens à Amazônia e ao Pantanal, fotografando e documentando os desmatamentos, além de recolher materiais para as suas obras, como raízes e troncos calcinados. Em 1969, participa de exposições em vários países e passa a ser internacionalmente conhecido. Em 1975, ganha uma exposição individual no Centro Nacional de Arte Contemporânea e no Centro Georges Pompidou, em Paris.

Frans Krajcberg (1921-2017) – “Sombra projetora”, 1979. Foto: Jaime Acioli.

A partir de 1972, viveu no sul da Bahia, onde manteve o seu ateliê no Sítio Natura, no município de Nova Viçosa. Chegou ali a convite do amigo e arquiteto Zanine Caldas (1919-2001), que o ajudou a construir sua morada: uma casa, a sete metros do chão, no alto de um tronco de pequi com 2,60 metros de diâmetro. À época, Zanine sonhava em transformar Nova Viçosa em uma capital cultural e a sua utopia.

Em 1978, durante 32 dias, Frans Krajcberg, o artista Sepp Baendereck e o crítico Pierre Restany cruzaram em um barco o Rio Negro, na região amazônica. Durante o trajeto eles refletiam sobre uma nova maneira de ver, sentir e fazer a arte dentro de uma ótica voltada para a realidade brasileira. Os dois artistas, Baendereck e Krajcberg, então já cidadãos brasileiros e declaradamente apaixonados pela nossa biodiversidade, convidaram o crítico Pierre Restany para que ele aprofundasse sua relação com o Brasil e pudesse perceber melhor a grandeza de nosso país. No final do empreendimento, além de um “Diário de Viagem”, Restany produziu o “Manifesto do Rio Negro”, que foi divulgado em outubro de 1978 em todo o mundo.

Em 1996, participa da exposição “Villette-Amazone/Manifesto para o Meio Ambiente no Século XXI”, no Grande Halle de la Villette, em Paris. “A obra de Krajcberg é um grito contra a destruição da Floresta Amazônica e tem uma força universal”, diz Jacques Leenhardt, sociólogo e filósofo francês que divide com Bettina Laville a organização da exposição. A ideia foi a de transformar o Parc de la Villette em um “território ecológico”. Logo ao entrar, o visitante depara com as esculturas monumentais de Krajcberg, que ocupam, com murais, colagens e fotografias, um espaço de 1.800 m2, totalizando 141 peças.

Foto: divulgação.

Por sua luta para a preservação do meio ambiente, mundialmente reconhecida, Frans Krajcberg recebe em 2012 do prefeito Bertrand Delanoë, a mais alta honraria de Paris, a Medalha Vermeil – prêmio de agradecimento pela contribuição às artes. Krajcberg é o único artista vivo não francês que possui um espaço dedicado às suas obras mantidas pela prefeitura parisiense.

Frans Krajcberg morreu em 15 de novembro de 2017 e seu desejo é cumprido: em um domingo, suas cinzas são depositadas no tronco de uma árvore escolhida por ele no sítio Natura, em Nova Viçosa, onde ele viveu desde 1972.

A obra de Krajcberg reflete a paisagem brasileira, em particular a floresta amazônica e a sua constante preocupação com a preservação do meio ambiente. Ao longo de sua carreira, o artista denunciou queimadas no estado do Paraná, a exploração de minérios no estado de Minas Gerais e o desmatamento da Amazônia e do Pantanal. No final da vida, ele focou em fotografia, reproduzindo o desmatamento e o descaso com o meio ambiente.

Serviço:

Exposição Frans Krajcberg (1921-2017) – “(…) ao acordar a natureza estava preta e branca.” Em diálogo com Luiz Garrido

18 de março a 6 de maio de 2023

Pinakotheke Cultural São Paulo

Rua Ministro Nelson Hungria, 200, Morumbi, São Paulo (SP)

Segunda a sexta-feira, das 10h às 18h, e sábados das 10h às 16h

Entrada gratuita

Telefone: (11) 3758-0546.

(Fonte: CWeA Comunicação)