Este ano, pela primeira vez na história do Carnaval, o número de blocos que desfilarão na cidade de São Paulo ultrapassará os do Rio de Janeiro. São esperados 796 blocos nas ruas da cidade, de acordo com a Secretaria Municipal de Cultura, contra 731 no Rio. As organizações de 31 blocos paulistanos declararam ter expectativa de público superior a 100 mil pessoas. Segundo a SPTuris, o público no Carnaval de rua paulistano saltou de 1,5 milhão de foliões em 2015 para 14 milhões em 2019 – no mesmo período, as mulheres ampliaram a sua fatia no total de foliões, passando de 46,9% para 54,1%. “São Paulo mostra uma tendência de retomada dos espaços públicos durante as festividades e muito disso é explicado pela crescente participação das mulheres”, afirma Gisele Jordão, produtora cultural e coordenadora de Cinema e Audiovisual da ESPM São Paulo.
De acordo com ela, a mudança no perfil dos blocos de rua e o avanço das pautas feministas contribuíram para essa mudança de cenário. “O ambiente nos blocos e nas ruas é mais favorável hoje para as mulheres do que há 10 anos. Elas assumiram papéis de liderança e a organização de vários blocos em São Paulo.”
Há cerca de 10 blocos criados e liderados por mulheres na cidade. Dois exemplos são o Pagu e o As Obscênicas. Mariana Bastos, cineasta e uma das organizadoras do Pagu, conta que inicialmente a ideia era homenagear grandes cantoras brasileiras, mas que o objetivo do bloco mudou de rumo. “Conforme amadurecemos a ideia, nos demos conta de que o Carnaval também envolvia questões sociais sensíveis para as mulheres, em especial a questão da violência”, afirma Mariana.
A arquiteta Lara Lima, uma das idealizadoras do bloco As Obscênicas, destaca a violência e a falta de representatividade como os principais problemas: “O Carnaval ainda é um ambiente muito masculino e isso se reflete na organização dos blocos. Por conta dessa estrutura, as mulheres acabam não tendo voz como deveriam. Muitas mulheres chegaram até nós insatisfeitas com o ambiente do Carnaval, inclusive relatando diversas formas de abuso e assédio.”
Apesar dos problemas sociais que motivaram a formação dos blocos femininos, ambas organizadoras dizem que houve avanços. “O aumento da participação das mulheres nos blocos é reflexo de uma movimentação social mais ampla, que também contempla o avanço feminino em outras áreas antes dominadas pelos homens, como a política e o mundo corporativo”, diz Mariana Bastos. Lara Lima, por sua vez, afirma que a iniciativa tem se espalhado no mundo do Carnaval: “Tenho visto cada vez mais mulheres assumindo posições de liderança no Carnaval. Outros blocos têm nos convidado para participar da organização e de tomadas de decisão. Mas ainda há um longo caminho a percorrer.”