Os impactos do homem sobre as florestas do Brasil e do mundo não se restringem ao desmatamento. O fogo, o corte de madeira e a invasão por animais e plantas exóticas, são exemplos de ações que atingem o que não ainda foi desmatado, os chamados remanescentes florestais. Mas qual é a dimensão desses impactos? Um estudo feito por pesquisadores da USP, em parceria com pesquisadores da França e da Holanda, mostra que os impactos humanos sobre os remanescentes florestais da Mata Atlântica já provocaram perdas de 23 a 42% da biodiversidade e dos estoques de carbono florestal. Ele será publicado na revista Nature Communications, nesta sexta (11).
Para chegar a esses resultados, os autores analisaram um grande conjunto de dados de inventários florestais para a Mata Atlântica visando quantificar as perdas em biomassa florestal, riqueza de espécies de árvores e, ao mesmo tempo, determinar as características funcionais e o valor de conservação destas espécies. Ao todo, foram analisados dados coletados em 1.819 pesquisas de campo, abrangendo amostras de biomassa de mais de um milhão de árvores, que representam em torno de 3 mil espécies. “Todos sabemos que a Mata Atlântica perdeu mais de 80% de suas florestas. Mas, o que muitos não sabem, é que a biodiversidade e estoques de carbono de seus remanescentes foram erodidos ao longo dos anos”, explica Renato Lima, líder do estudo. “Os remanescentes florestais perderam de um quarto a um terço de seus estoques de carbono e de suas espécies de árvores, principalmente entre as espécies endêmicas da Mata Atlântica”, complementa Lima.
O estudo também fez projeções sobre quanto estas perdas representariam para a Mata Atlântica inteira. “As perdas dos estoques de carbono equivalem ao desmatamento de até 70 mil quilômetros quadrados de florestas (o que representa quase 10 milhões de campos de futebol) ou 2,6 bilhões de dólares em créditos de carbono”, indica Paulo Inácio Prado, coautor do estudo e professor da USP. “E essas quantias não consideram outros serviços ecossistêmicos importantes, como o ciclo da água e a regulação do clima”, acrescenta Prado.
Segundo os pesquisadores, estudos avaliando os impactos humanos tanto na biomassa quanto da biodiversidade florestal são raros. Uma das razões, como explica Jérôme Chave, colaborador francês do estudo, se deve ao fato da “degradação da biodiversidade ser difícil de ser mensurada usando apenas sensores remotos como imagens de satélite”. Para conseguir dados confiáveis sobre a perda da biodiversidade, é preciso ir a campo.
Uma das saídas para buscar reverter as perdas de biodiversidade e carbono é a restauração florestal dentro dos remanescentes florestais degradados. “A restauração das áreas ao redor destas áreas é importante, mas ela não garante a recuperação da biodiversidade e estoques de carbono perdidos dentro desses remanescentes. Assim, a restauração florestal é necessária tanto fora quanto dentro dos remanescentes degradados da Mata Atlântica”, comenta André de Gasper, também coautor do estudo.
O estudo reforça que a conservação da biodiversidade e do carbono em florestas tropicais não depende apenas do desmatamento evitado ou da restauração de áreas degradadas, mas também do combate à degradação nos fragmentos florestais que restaram. “A mensagem otimista é que o combate à degradação florestal na Mata Atlântica pode atrair bilhões de dólares em investimentos relacionados a créditos de carbono. Portanto, remanescentes florestais degradados podem ser vistos não como um ônus, mas como uma oportunidade para atrair investimentos”, conclui Renato Lima.
(Fonte: Agência Bori)