Pesquisa da FGV revela que o Brasil possui mais celulares que pessoas (234 e 211 milhões, respectivamente) – não há como, em 2021, escapar de uma foto, de uma filmagem ou de um flagra que, ao ser registrado, pode ganhar o mundo pela internet. Para entender o fluxo que uma foto íntima – o famoso ‘nude’ – percorre entre o clique e a exposição, a doutora em antropologia e pesquisadora Beatriz Accioly Lins lança pela Editora Telha o livro Caiu na Net: Nudes e exposição de mulheres na internet, cujo maior foco está na figura da mulher, que sofre infinitamente mais com essa divulgação se comparada ao homem. “Após acompanhar, para minha tese de doutorado, a rotina dentro de duas delegadas de defesa da mulher, percebi o aumento dos registros de ameaças e chantagens ligados às novas tecnologias, principalmente o uso dos smartphones”, afirma a autora.
Beatriz conduz o leitor pela trilha dessas imagens vítimas de julgamentos morais, acusações e até perseguições. Sua pesquisa acompanhou ativistas, gestores públicos, juristas, jornalistas e pesquisadores a fim de elucidar as consequências desses atos e, também, como o Direito pode zelar pelos direitos da vítima dessas divulgações criminosas. Nesses casos, o advento das redes sociais e da sociedade cada vez mais conectada se torna um inimigo implacável que atua em prol de quem visa constranger, intimidar e até aliciar alguma mulher.
Para a autora de Caiu na Net, tais materiais ilustram sem sombra de dúvida a desigualdade e circunstancial violência de gênero que elas sofrem dentro dessa temática. Se, para algumas mulheres, o ‘nude’ representa novas experiências de paquera e sedução, essa atitude pode vir a se reverter em chantagem quando aquela imagem deixa de ter um ou dois conhecedores e passa a ser acessada por milhares de pessoas, o que configura o chamado “vazamento”.
“A tipificação penal em 2013, quando houve o ‘boom’ dos celulares no país, dificultava o trabalho da polícia. À época, pegamos emprestado o termo ‘pornografia de vingança’ da língua inglesa, na falta de termos uma nomenclatura nossa”, comenta Beatriz.
O julgamento que antes só se via em tribunais ganhou uma nova esfera: a cibernética. A pessoa que é exposta em sua intimidade nas redes sociais é taxada como sem valor e sofre um linchamento social muitas vezes pior que o veredito de uma ação de danos morais que possa ser movido contra o divulgador das fotos.
Caiu na Net é potente e esclarecedor. Mostra como, na sociedade atual, nada é muito simples no trânsito entre os prazeres e os perigos ou, nos bons termos da autora, entre o desejado e o nocivo.
Sobre a Editora Telha | A Telha é uma editora independente voltada à publicação de obras críticas sobre temas contemporâneos.
Sobre a autora | Beatriz Accioly Lins é antropóloga, doutora e mestra em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo, além de Pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre Marcadores Sociais da Diferença (Numas-USP). Desenvolve pesquisas sobre acesso a direitos, noções e percepções de justiça em se tratando de violência contra mulheres e suas interseções com marcadores sociais da diferença. É, ainda, autora do livro A lei nas entrelinhas: a Lei Maria da Penha e o trabalho policial (Ed. Unifesp, 2018) e coautora do livro Diferentes, não desiguais: a questão de gênero na escola (Reviravolta, 2016).
Serviço:
Livro Caiu na Net
Autora: Beatriz Accioly Lins
Editora: Telha
Páginas: 268
Preço: R$59,00.