Um estudo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) registrou pela primeira vez a presença do verme Angiostrongylus cantonensis nas regiões metropolitana e centro fluminense do estado do Rio de Janeiro. Os resultados estão publicados na revista científica ‘Memórias do Instituto Oswaldo Cruz’ nesta quarta (6). Nos humanos, este parasita é causador da meningite eosinofílica, doença que afeta o sistema nervoso central. A infecção ocorre principalmente pela ingestão de caracóis e lesmas crus parasitados com larvas deste verme, mas também por meio da ingestão do muco dos moluscos, contendo larvas, liberados sobre alimentos como frutas e vegetais.
O levantamento encontrou larvas do parasita em 230 dos 2.600 caracóis examinados, quase 9%, em 26 dos 46 municípios estudados – entre os quais, a capital, Niterói, Nilópolis, Maricá, Nova Iguaçu e Seropédica.
Os pesquisadores forneceram um panorama da distribuição de A. cantonensis no estado do Rio de Janeiro, assim como das espécies de caracóis e lesmas que atuam como seus hospedeiros intermediários. Ao longo de quatro anos, a equipe coletou os animais manualmente em áreas urbanas e periurbanas, como parques e terrenos baldios. Esses locais são comumente ocupados também por hospedeiros definitivos do parasita, como ratos. Tratam-se, portanto, de áreas com potencial epidemiológico, explica a pesquisadora em saúde pública do IOC/Fiocruz Suzete Rodrigues Gomes, uma das autoras do estudo.
Publicações documentam 40 casos de meningite eosinofílica no Brasil, com mais de 100 casos suspeitos em oito estados, incluindo o Rio de Janeiro. A literatura científica associa a disseminação do nematódeo e, consequentemente, dos casos da doença no Brasil nas últimas duas décadas à propagação do caracol gigante africano Achatina fulica, uma espécie invasora. Conforme o estudo, ela foi a espécie mais frequente e amplamente distribuída no Rio de Janeiro, tendo sido encontrada infectada pelo verme em 22 municípios.
Gomes observa que lesmas e caracóis que atuam como hospedeiros do parasita A. cantonensis são, em geral, espécies exóticas ou nativas comuns em áreas urbanas. “Estudos têm mostrado que as espécies de moluscos mais abundantes em áreas urbanas são aquelas que mais provavelmente serão também encontradas infectadas”, aponta a pesquisadora.
Apesar do caracol africano Achatina fulica ter sido aquele com a maior distribuição e comparativamente mais encontrado parasitado com A. cantonensis, há outras espécies de moluscos terrestres com importância médica, incluindo, por exemplo, lesmas, como Angustipes erinaceus, que merecem atenção. Uma surpresa para os pesquisadores foi encontrar pela primeira vez o pequeno caracol sinantrópico (adaptado a povoamentos humanos) Leptinaria unilamellata naturalmente infectado com A. cantonensis.
A meningite eosinofílica é considerada uma doença emergente, porém ainda negligenciada e, por isso, pouco diagnosticada. O trabalho alerta para a importância do acompanhamento dos riscos por órgãos de saúde e para a conscientização da população, que deve higienizar corretamente os alimentos crus antes do consumo, por exemplo. “Esse mapeamento fornece informações essenciais para a avaliação do risco de infecção humana e deve ajudar as autoridades de saúde locais a fornecer um diagnóstico mais rápido e preciso sempre que houver suspeita da doença”, ressalta Gomes.
(Fonte: Agência Bori)