Um contingente de 38 milhões de trabalhadores brasileiros que recebeu o auxílio emergencial do governo federal durante a pandemia não está inscrito no Cadastro Único do governo federal e, por isso, não receberá os benefícios do Bolsa Família quando o auxílio emergencial for extinto. Chamados recentemente de “invisíveis” pelo ministro Paulo Guedes, eles representam 61% dos trabalhadores que receberam auxílio emergencial. Mais da metade desses trabalhadores desempenham atividades informais (64%) e têm um baixo nível de qualificação com, no máximo, ensino fundamental (55%), fatores que os tornam vulneráveis às intempéries do cenário econômico. A análise, de pesquisadores do Centro de Estudos de Microfinanças e Inclusão Financeira (FGVcemif) da Fundação Getulio Vargas, está em relatório publicado nesta terça (6).
Para explorar a questão dos trabalhadores “invisíveis” e entender como um futuro cenário de ausência de mecanismos de transferência de renda e de falta de recuperação econômica poderia afetá-los, os pesquisadores trabalharam com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Covid-19 de trabalhadores que receberam o auxílio emergencial. Além de descrever as características dos “invisíveis” — que receberam o auxílio, mas não recebem o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) —, os pesquisadores estimaram os efeitos do auxílio emergencial sobre a renda desses trabalhadores e atualizaram estimativas de pesquisas anteriores de efeitos sobre renda de todos os trabalhadores. O governo federal ainda não detalhou como vai inserir esses trabalhadores no programa social Renda Cidadã, anunciado na semana passada (28).
O ganho médio de renda dos trabalhadores “invisíveis” foi semelhante ao ganho de outros tipos de trabalhadores. Dentre os invisíveis, os trabalhadores informais são os que obtêm maior ganho percentual de renda com o auxílio emergencial. No caso das mulheres, o ganho de renda comparado à renda usual anterior à pandemia chega a 52%. Nos homens, o ganho é de 37% comparado à renda anterior.
Apesar de estarem fora do radar do Cadastro Único e, consequentemente, não poderem acessar o principal programa de transferência de renda do governo, a maioria destes trabalhadores (74%) ganha em torno de R$1.254,00 mensais, o que os coloca em uma posição de vulnerabilidade. “O fato de não serem pobres o suficiente os torna inelegíveis para o Bolsa Família, enquanto outros não atendem aos critérios de elegibilidade do Benefício de Prestação Continuada, destinado a pessoas com deficiência ou aposentados. Também temos falhas de implementação do programa e falta de recursos para expansão que causam essa situação de invisibilidade dessas pessoas”, explica o pesquisador Lauro Gonzalez, autor do estudo.
Para Lauro, o auxílio emergencial escancarou a precariedade de parcela relevante do mercado de trabalho no Brasil e mostra a insuficiência do Bolsa Família como programa de transferência de renda social. “Há um contingente de milhões que, embora não recebam o Bolsa Família ou o BPC, possuem fluxos de renda baixos e variáveis, geralmente oriundos de atividades inseridas na economia do ‘bico’”, diz. Para sair desta situação, segundo ele, “é preciso repensar as políticas de transferência de renda e formular programas que levem em consideração as características da baixa renda e suas formas de inserção no mercado de trabalho”.
(Fonte: Agência Bori)