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Artigo: “Ser cientista no Brasil: um direito também das mulheres”

Brasil, por Kleber Patricio

Foto: CDC/Unsplash.

Nos últimos anos, uma série de mudanças na legislação tem tentado ampliar a promoção do acesso e financiamento à Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) implicando os entes federativos neste processo. A criação do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, em 2014, a modificação da Constituição Federal, em 2015, com a inserção de cláusula que permite à União, Distrito Federal e municípios legislarem conjuntamente nos temas de CT&T, e a aprovação do Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação, em 2016, fazem parte destes esforços e permitiram articular a colaboração entre organizações públicas e privadas para promover o desenvolvimento científico tecnológico e a inovação.

Essas alterações fizeram com que o Estado assumisse a obrigação de oferecer políticas que permitam a fruição do direito à Ciência e Tecnologia para todos os brasileiros. Entretanto, cabe perguntar: como as mulheres usufruem deste direito constitucional? De forma específica, até que ponto a implementação de marcos jurídicos leva em consideração a situação desigual das mulheres que produzem ciência no Brasil?

Para analisar alguns desses aspectos, tomamos como exemplo os impactos do Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei Nº13.243), passados cinco anos da sua aprovação, no trabalho feminino na ciência. Essa lei, que passou a regular incentivos ao desenvolvimento científico no país, pretendia reduzir alguns obstáculos legais e burocráticos presentes em normas legais anteriores, com vistas a criar um ambiente favorável à inovação nas diferentes instituições de ciência e tecnologia (ICTs), nas empresas e entidades privadas sem fins lucrativos do Brasil.

Entendemos que criar um ambiente favorável para a inovação também passa por promover equidade de gênero nas comunidades acadêmicas. Apesar das mulheres corresponderem a 54,4% do total de títulos de doutorado concedidos no Brasil, em 2019, há uma concentração de atuação em áreas como humanidades e sub-representação nas áreas de ciências exatas, como tecnologia, matemática e engenharia. As mulheres corresponderam a apenas 35,9% dos títulos concedidos na área de Ciências Exatas e da Terra, 36,6% na área de Engenharias e em Ciências Agrárias, 55,8%, segundo levantamento da Fapesp em 2021.

Cenário semelhante se dá em nível de mestrado, no qual as mulheres possuem 55,7% das titulações e apenas 30,9% das titulações em ciências exatas e da terra e 36,7%, em engenharias, segundo levantamento de 2020 do Ministério da Ciência e Tecnologia em 2020

Em nível de graduação, apesar da porcentagem de graduandas chegar a quase 55% das matrículas no país em 2019, segundo dados do MEC. Neste ano, as mulheres corresponderam a uma minoria de concluintes de cursos da engenharia, produção e construção (37%), e computação e tecnologias da informação e comunicação (13,6%). Em 2020, esses índices chegam a 75,6%, 73,8% e 72,3% nas áreas de educação, saúde e bem-estar e ciências sociais, informação e comunicação.

Nesse sentido, a RBMC assume a missão de contribuir na equidade de gênero na ciência. Uma das maneiras de atuar nesta área é formular de propostas que permitam às instituições de pesquisa reconhecerem a importância das lentes de gênero.

Outra tarefa importante que consideramos que impacta nesta realidade é a ampliação dos recursos destinados à Ciência e Educação, que sofreram uma diminuição de 29% em relação ao orçamento de 2020. Aqui não é possível ignorar a responsabilidade do Estado nesse processo. Nesse contexto de pandemia, a possibilidade de que as mulheres cientistas não consigam desenvolver suas pesquisas por causa da falta de financiamento é concreta. Efetivar o constitucional direito da ciência, tecnologia e inovação para as mulheres passa por implementar medidas de inclusão das cientistas na produção de ciência nacional, em todas as áreas.

Sobre as autoras:

Ana Claudia Farranha, pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB) e membro da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas (RBMC).

Erica da Cruz Novaes Gonçalves Dias, doutoranda da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas (RBMC).

(Fonte: Agência Bori)