Doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, e infecciosas, como Covid-19 e tuberculose, figuram como mais prevalentes em migrantes e refugiados do que em brasileiros, segundo reporta estudo de pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e colaboradores de instituições nacionais e internacionais. Oito entre dez dos refugiados escutados pela pesquisa dependem do Sistema Único de Saúde (SUS) para diagnóstico e tratamento de saúde. Os dados estão em artigo publicado na sexta-feira (10) na “Revista Latino-Americana de Enfermagem”.
A pesquisa, que contou com apoio financeiro da Organização Mundial da Saúde (OMS), coletou dados relacionados à saúde de 553 refugiados e migrantes do país de 17 de agosto a 30 de outubro de 2020 por meio de questionário online composto por perguntas em português ou espanhol. Tais informações foram divididas em oito categorias: dados pessoais, dados sobre migração, populações vulneráveis, dados socioeconômicos, tuberculose, histórico de saúde, Covid-19 e seguro e sistema de saúde. Os participantes do estudo se declaram estrangeiros, residentes no Brasil e maiores de 18 anos e representam cerca de 1% dos refugiados no país que, em 2021, contava com uma estimativa de 60 mil pessoas reconhecidas nesta condição, segundo a Agência da ONU para Refugiados (Acnur).
De acordo com os autores, as prevalências registradas no estudo – de 28% de hipertensão, 21% de diabetes, 7% de Covid-19 e 3% de tuberculose – corroboram a hipótese de que há uma prevalência maior destas doenças entre refugiados e migrantes do que na população em geral. Um estudo feito em 2020 pelo Ministério da Saúde havia estimado que, na população geral, há presença de 24% de hipertensos, 7% de diabéticos e 1% de tuberculosos – números, portanto, menores em relação à população estudada.
Entre as vulnerabilidades, 32% referiram desemprego, 37,6% mudaram para o Brasil em decorrência da situação social do seu país e 33,6% residiam em asilo e ou abrigo. Durante a pandemia da Covid-19, a maioria da população de migrantes e refugiados estudada declarou ter sofrido impacto na renda familiar. Além do acesso ao SUS, mais da metade desse grupo (60%) teve acesso ao auxílio emergencial, benefício disponibilizado pelo governo.
Sobre a prevalência de Covid-19 em migrantes e refugiados, os autores fizeram a ressalva que os dados foram coletados antes da segunda e terceira onda de Covid-19, no Brasil, ou seja, não considerando as variantes gama e ômicron, que causaram as maiores incidências de casos da doença a partir de 2021. Eles referenciam que o país não adotou a recomendação mundial de testagem em massa e, desta forma, a estimativa da prevalência fica enviesada.
Sabendo que migrantes e refugiados são considerados vulneráveis socialmente pela Organização das Nações Unidas (ONU), os pesquisadores julgam importante que essa população tenha acesso aos seus direitos uma vez que são acolhidos num país. Existem iniciativas de direcionamento realizadas em parceria com o governo federal, mas o Brasil ainda não possui uma política específica de amparo ao migrante. Para Sonia Vivian, autora principal do artigo, “o desafio para as cidades receptoras é assegurar, por meio do SUS, o acesso ao serviço de saúde pública, principalmente, promovendo e estimulando o uso da Atenção Primária à Saúde”, afirma.
Embora apresente como limitação um baixo número de participantes, em comparação à população que migrou ou pediu asilo no Brasil nos últimos anos, os resultados desse estudo podem subsidiar políticas públicas do governo federal e orientar a ação de profissionais da saúde. Manaus, por exemplo, foi a primeira cidade brasileira a desenvolver um plano de atenção à saúde de migrantes em situação de rua. Segundo a autora, estudos futuros são importantes para usar esse exemplo em outros municípios, além de “aprimorá-lo para que todos os migrantes internacionais e refugiados tenham igual acesso à saúde efetiva e universal, conforme prevê a legislação que regulamenta o SUS, especialmente considerando os processos culturais e a importância da interculturalidade”, reforça Sonia.
(Fonte: Agência Bori – Pesquisa indexada no Scielo)