Cerca de 5% da população de botos amazônicos da região de Tefé, no Médio Solimões, morreu desde o início da seca que atinge o estado do Amazonas. A estimativa é da pesquisadora Miriam Marmontel, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, organização social vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Segundo ela, a mortandade inclui botos vermelhos e tucuxis. Especialista em mamíferos aquáticos, Miriam pesquisa os botos da Amazônia há 30 anos. Segundo ela, a população de botos e tucuxis no Lago Tefé é estimada em 900 e 500 indivíduos, respectivamente. “Estamos enfrentando um evento de mortalidade incomum de botos amazônicos no Lago Tefé – uma situação muito preocupante e grave. Entre sábado (24) e segunda-feira (2), perdemos 110 animais, entre botos-vermelhos e tucuxis”, explicou.
De acordo com a pesquisadora do Instituto Mamirauá, a causa da morte desses animais ainda é desconhecida. Ela acredita, no entanto, que a mortandade está ligada às altas temperaturas das águas. “A minha impressão é que tem algo na água, obviamente, relacionado à situação de seca extrema, baixa profundidade dos rios e, consequentemente, ao aquecimento das águas. A média histórica da temperatura da água no Lago do Tefé é de 32 graus e, na quinta-feira, nós aferimos 40 graus até três metros de profundidade”, disse.
Miriam ressaltou que equipes de apoio e resgate de cetáceos vivos chegaram a Tefé no fim de semana. “Seguimos com a coleta e amostram de animais mortos e o monitoramento dos vivos. Agora, vamos tentar uma captura de animal debilitado para coleta de amostras e acompanhamento.”
A pesquisadora explicou ainda que foi alugado um barco flutuante com piscina, para onde serão levados os animais resgatados com vida. O objetivo é manter os animais nesta piscina até sair o resultado da análise dos estudos. “Se for um agente infeccioso, seria muito arriscado liberar os animais para o rio Solimões, pois terminaria infectando o resto da população. Aparentemente, isso é um evento isolado no Lago Tefé e não há registro de algo semelhante acontecendo nas cidades do entorno”, concluiu a pesquisadora.
População afetada
O diretor do Instituto Mamirauá, João Valsecchi, acrescenta que o baixo nível da água no Lago Tefé também tem causado transtornos para a população. “Os eventos extremos têm impactado não somente a biodiversidade da região, mas também a população da Amazônia pela dificuldade de mobilidade, incluindo restrição de acesso a muitas áreas e, consequentemente, o aumento do custo de vida”, relatou. “Escolas estão sendo fechadas, linhas de barcos deixam de funcionar, todos os produtos estão mais caros nas cidades e principalmente no interior e, neste ano, de forma muito atípica, estamos registrando a mortalidade de pescado e botos no Lago Tefé”, ressaltou.
Segundo o diretor do Mamirauá, na seca de 2010, o Lago Tefé atingiu um nível ainda mais baixo, mas os impactos da seca atual podem ser piores. “Esta seca de 2023 pode se tornar mais extrema. Mesmo antes de atingir níveis tão baixos, o evento causou mais danos do que qualquer outro anterior. Isso provavelmente é consequência de um acúmulo de impactos causados pela poluição urbana, pelo assoreamento do Rio Tefé, pela poluição do ar, devido ao grande número de queimadas, e pode ser que ainda sejam descobertos outros agravantes.”
Ações com a comunidade
Além do trabalho realizado para recuperar os cetáceos, pesquisadores do Instituto Mamirauá também estão ajudando a população ribeirinha. “A gente monitora as informações sobre o nível do rio e o clima e emite boletins periódicos que são distribuídos na rádio local e pelas redes sociais”, informou o pesquisador Ayan Fleischmann.
O mapeamento da profundidade do Lago Tefé é disponibilizado para evitar que os barcos encalhem. “Também estamos falando sobre a seca em locais como a feira municipal para conscientizar a população e discutir medidas de adaptação sobre os eventos climáticos extremos que temos vivido”, destacou. “Para lidar com esses impactos, precisamos que a população local se engaje para que possamos nos antecipar à próxima seca extrema.”
(Fonte: Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação – MCTI)