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Galatea apresenta coletiva que conecta artistas intergeracionais pelo experimentalismo

São Paulo, por Kleber Patricio

Maíra Dietrich (1988), Cena 21 – Gagueira, da série Olho que vê olho que lê, 2022. Foto: Julia Thompson.

A Galatea inicia o calendário expositivo de 2025 da unidade da Rua Oscar Freire, em São Paulo, com a mostra coletiva ‘Adiar a ordem’, que conta com obras de cinco artistas convidadas — Bianca Madruga (Rio de Janeiro, 1984), Cinthia Marcelle (Belo Horizonte, 1974), Isadora Soares Belletti (Belo Horizonte, 1995), Leila Danziger (Rio de Janeiro, 1962), Maíra Dietrich (Florianópolis, 1988) — e de Carolina Cordeiro (Belo Horizonte, 1983), representada pela galeria. Com curadoria de Fernanda Morse, a exposição reúne artistas mulheres de diferentes gerações que estão produzindo, hoje, sob o vasto guarda-chuva do que se entende como arte conceitual. Herdeiras das vanguardas e das neovanguardas, elas baseiam suas práticas em intenso experimentalismo e transitam entre diferentes linguagens elas transitam entre diferentes linguagens, como o desenho, a colagem, o vídeo, a instalação, a escultura e o objet trouvé, e suportes/materiais como o papel, o metal, o tecido, o látex, o durex, a pedra, o galho e outros ainda.

O título da exposição se relaciona, justamente, com o caráter não-convencional dos métodos e recursos mobilizados pelas artistas. É como se, nesses trabalhos, houvesse uma busca por desafiar a ordem das coisas; é como se, através deles, a ordem das coisas fosse desfeita: vemos uma bandeira sem pátria ou mensagem, muros esburacados, documentos violados e recortados, jornais apagados, palavras rasuradas, gaiolas escancaradas etc.

Leila Danziger, 1962, Pallaksch, Pallaksch, 2010/2025. Foto: Pat Kilgore

O fato de todas as artistas serem mulheres reflete uma posição da curadoria, mas não é o assunto principal da mostra. A escolha das artistas partiu da percepção de que, mesmo com práticas tão singulares, seus trabalhos se conectam pelas sutilezas. São obras que demandam atenção e tempo para serem absorvidas, indo na contramão dos discursos prontos e da aceleração que vivemos hoje. Alinhando-se à própria natureza dos trabalhos, o processo curatorial se desenrolou ao longo de meses de interlocução entre a curadora e as artistas, a fim de que o resultado pudesse transparecer o momento atual de suas produções e se correspondesse com a pesquisa de cada uma.

Para construir o fio conceitual da exposição, Fernanda Morse partiu do repertório adquirido no campo da Teoria Literária, no qual se formou. A curadora defende que essas obras se alinham à definição primordial o que é a poesia, no ponto em que ela é reconhecida enquanto a forma de expressão mais condensada e carregada de sentido, construída a partir de um uso insubordinado e subversivo da linguagem. Pode-se dizer, assim, que os trabalhos apresentados manifestam a poesia em caráter expandido, extrapolando a linguagem escrita e mostrando que o traço poético é uma presença que se encontra não só em expressões verbais, mas nas mais variadas expressões artísticas.

A esse respeito, Fernanda comenta: “Não raro dizemos que não só um texto, mas uma paisagem, uma imagem ou um gesto é poético. Ao fazê-lo, tentamos dar conta de algo inexplicável que nos sensibiliza no encontro com as coisas existentes neste mundo. O poético, então, fala daquilo que chama e requer a nossa atenção e que, a partir disso, nos comove. Esse uso adjetivo do termo poético nos permite entender a noção de poesia como um tipo de presença que não se restringe ao domínio das letras e do poema como texto literário. Acredito que nesta exposição vemos trabalhos que perseguem a poesia, trabalhos onde a poesia mora.”

Carolina Cordeiro 1983, Sem título, da série Há uma observação a ser feita [Untitled, from the Há uma observação a ser feita series] , 2023. Foto: Ding Musa.

Ao mesmo tempo, a relação com a língua, a escrita e a literatura perpassa a produção de diversas das artistas selecionadas. Leila Danziger, por exemplo, é reconhecida pela sua produção literária, cujos temas e pesquisas andam junto da sua prática enquanto artista visual. Bianca Madruga há anos desenvolve trabalhos que trazem versos e nomes de poetas em seus títulos e na própria obra. Maíra Dietrich faz da escrita parte ativa do seu processo de criação, sendo ela o assunto e o meio de realização do seu trabalho. Carolina Cordeiro conversa com diversos escritores, poetas e compositores nos títulos das suas obras, além de partir, em diversas ocasiões, do objeto-livro, da página e da folha em branco para desenvolver a sua produção. Cinthia Marcelle encara os seus desenhos com fita crepe/durex sobre o papel e as listras que apaga e refaz sobre o tecido como uma forma de escrita. Já Isadora Soares Belletti explora a poesia que existe na passagem de um idioma a outro a partir da sua vivência enquanto imigrante na França.

Entre os trabalhos que serão apresentados, destacam-se a nova série de Carolina Cordeiro, em que desenha com tiras de zinco sobre o papel; uma nova versão, dessa vez com durex, da importante série de muros vazados desenhados até então com fita crepe por Cinthia Marcelle e cujo o título, Por via das dúvidas, deu nome à sua exposição panorâmica realizada pelo MASP em 2022; além da grande instalação Pallaksch Pallaksch, de Leila Danziger, que é um desdobramento do trabalho que desenvolve com jornais e pelo qual ganhou o Prêmio SESC de Arte Brasileira na ocasião da 22ª Bienal Sesc Videobrasil, em 2023.

Sobre as artistas

Bianca Madruga (Rio de Janeiro, 1984) vive e trabalha no Rio de Janeiro. Formou-se em Filosofia pela UFF, é mestre em Estética e Filosofia da Arte pela mesma universidade e doutora em Artes Visuais pelo PPGARTES – UERJ. Através de materiais e mídias diversos, seu trabalho busca instaurar uma espécie de inoperância frente às estruturas. Olhar para baixo, usar a mão esquerda, operar a partir do furo, da fratura — são gestos que indicam o seu desejo de reposicionar o corpo no espaço e fazer falhar aquilo que se impõe como lógica e conformação dos vocabulários hegemônicos.

É cofundadora do espaço A MESA, criado em 2015 no Rio de janeiro. Participou de residências artísticas na Casa da Escada Colorida (Rio de Janeiro, 2020) e na FAAP (São Paulo, 2019). Entre as suas mostras individuais, estão: Os trabalhos e as Noites, ato I (A MESA, Rio de Janeiro, 2023), Os trabalhos e as Noites, ato II (Reserva Cultural, Rio de Janeiro, 2023), Ponto de queda (Galeria IBEU, Rio de Janeiro, 2019), entre outras. Entre as coletivas, destacam-se: UZAPO HAW TATEHAR UZAPO (Recipiente Porongo, Rio de Janeiro, 2024), Aqui (Galeria de Arte da UFF, Niterói, 2024), Poéticas do agora (CCJF, Rio de Janeiro, 2023), Não quebres com dores duras demais (Casa França-Brasil, Rio de Janeiro, 2022), Salão Mac Paranaense (MAC Paraná, Curitiba, 2022), Dobras (Paço Imperial, Rio de Janeiro, 2022), A utopia do não (Paço Imperial, Rio de Janeiro, 2019), entre outras.

Carolina Cordeiro (Belo Horizonte, 1983) vive e trabalha em São Paulo. Formada em Desenho pela UFMG, possui mestrado em Linguagens Visuais pela UFRJ e doutorado pela USP, com período sanduíche no Chelsea College of Art and Design, Londres. Sua prática se caracteriza pela pluralidade de suportes, marcada por processos imersivos e pela relação com o ambiente, propondo uma contaminação pela paisagem ao invés de meras intervenções no espaço. Seus títulos revelam o diálogo com a poesia e a música popular brasileira, como em América do Sal (2021), inspirado em Oswald de Andrade, As impurezas do branco (2019), referência a Carlos Drummond de Andrade, e O tempo é, que parte de uma canção de Gilberto Gil.

Cordeiro fundou, em 2021, a Galeria de Artistas – GDA, projeto coletivo criado por e para artistas como meio de experimentar novas formas de inserção no mercado. Participou de residências como CASCO (Rio Grande do Sul, 2021), Pivô Arte e Pesquisa (São Paulo, 2019), Red Bull Station (São Paulo, 2016), Homesession (Barcelona, Espanha, 2011); GlogauAIR Art Residency (Berlim, Alemanha, 2009) e foi indicada ao Prêmio PIPA em 2020. Entre suas exposições destacam-se: Carolina Cordeiro: o tempo é (Individual, Galatea, São Paulo, 2023); América do Sal (Individual, GDA, São Paulo, 2021); Casa no céu (para Rochelle) (Coletiva, Galeria Vermelho, São Paulo, 2023); I remember earth (Coletiva, Le Magasin des horizons, Grenoble, 2019).

Cinthia Marcelle (Belo Horizonte, 1974) vive e trabalha em São Paulo. Formou-se em Belas Artes pela UFMG. Transitando entre instalação, fotografia, vídeo, pintura, colagem e desenho, a artista desenvolve seu trabalho ao redor dos sistemas de conceitos que organizam politicamente e culturalmente o mundo. Para tanto, o dado social se faz central na concepção de sua obra, que conta, muitas vezes, com processos de elaboração coletivos. Levando em consideração as diferentes experiências de estar no mundo, a artista se atenta ao poder de transformação advindo da organização e da desorganização das coisas, seja para questionar, seja para confrontar estruturas hegemônicas e relações de poder.

Realizou mostras panorâmicas no Marta Herford Museum for Art (Herford, Alemanha, 2023), MACBA (Barcelona, Espanha, 2022), MASP (São Paulo, Brasil, 2022); exposições individuais no Wattis Institute (São Francisco, EUA, 2018), Modern Art Oxford (Oxford, Reino Unido, 2017), MoMA PS1 (Nova York, EUA, 2016), Secession (Viena, Áustria, 2014). Participou da 15ª Bienal de Gwangju (2024), 10ª Bienal de Berlim (2018), 12ª Bienal de Sharjah (2015); Trienal do New Museum (2012); 13ª Bienal de Istambul (2013); 29ª Bienal de São Paulo (2010); 9ª Bienal de Lyon (2007); 9ª Bienal de Havana (2006). Ocupou o Pavilhão do Brasil na 57ª Bienal de Veneza (2017) e recebeu Menção Honrosa. Foi contemplada pelo Future Generation Art Prize (2010); International Prize for Performance (2006); Bolsa Pampulha (2003).

Leila Danziger (Rio de Janeiro, 1962) vive e trabalha no Rio de Janeiro. Desde 2006, é professora do Instituto de Artes da Uerj. Seu trabalho lida com os restos e as ruínas das informações (páginas de jornais, livros, hiperlinks, agendas, e documentos diversos), desenvolvendo-se em diferentes meios (técnicas de impressão e de apagamento, instalação, pintura, video e escrita).

Entre suas exposições individuais estão Descer da nuvem (Museu Judaico de São Paulo, 2022); Navio de emigrantes (Caixa Cultural de Brasília, 2018); Ao sul do futuro (Museu Lasar Segall, São Paulo, 2018). Entre as coletivas, destacam-se The Travelling Eye in Lands, Real and Imagined (Bienal de Bengala/Shantiniketan Artshila, Bolpur, India, 2024); A memória é uma ilha de edição (22ª Bienal Sesc Videobrasil, Sesc 24 de Maio, São Paulo, 2023), onde foi contemplada com o Prêmio SESC de Arte Brasileira; Espaços do ainda (Paço Imperial, Rio de Janeiro, 2022); Mémoire des livres (Galerie Dix9, Paris, França, 2021). Em poesia, publicou Três ensaios de fala (2012); Ano novo (2016) e Cinelândia (2021), todos pela editora 7Letras. Publicou também o livro de artista Cadernos do povo brasileiro, pela Relicário Edições.

Isadora Soares Belletti (Belo Horizonte, 1995) vive e trabalha em Paris. Estudou cinema e comunicação social na FAAP, São Paulo, antes de se mudar para França, onde prosseguiu os seus estudos na Beaux-Arts de Paris, concluindo o seu mestrado em 2024 com as honras do júri. Na sua prática, a artista explora as relações entre seres vivos (humanos e/ou outras formas de vida) e paisagem, através de uma perspectiva do deslocamento, do afeto e da compreensão contextual. Seja produzindo filmes, esculturas ou instalações, Isadora cria pontes que ligam esses elementos por meio de narrativas expandidas, moldando ambientes sensoriais onde a percepção, o movimento e as experiências do corpo e do olhar desempenham um papel central.

Entre as suas exposições recentes, destacam-se: Espaço para dia sem sol (individual, Solar Galeria de Arte Cinemática, Vila do Conde, Portugal, 2024); Une mer de petites flammes (coletiva, Air de Paris, França, 2024); Je ne suis pas toujours là où je crois être (projeto sonoro, Museu do Louvre, Paris, França, 2024); Sur le feu (coletiva, Palais des Beaux-Arts de Paris, 2023). Em 2024, Isadora foi contemplada com o prêmio FoRTE (Fonds régional pour les talents émergents) na categoria de artes visuais, graças ao qual irá expor no  Frac Île-de-France em 2025.

Maíra Dietrich (Florianópolis, 1988) vive e trabalha em São Paulo. Bacharel em Artes Plásticas pelo CEART-UDESC, Mestre em Fine Arts pelo KASK School of Arts e Pós Graduada no programa Art By Translation pela École d’Arts de Paris-Cergy e École d’Art TALM-Angers. Trabalha questões da relação entre a linguagem e o corpo através de colagem, instalação, vídeo, performance e ficção. Desde 2012 se dedica a pesquisar e divulgar textos de artista através do selo A Missão.

Entre as suas exposições, destacam-se: CENA-SINTAXE (Individual, GDA, São Paulo, 2022), Escrever sobre ler (Individual, auroras, São Paulo, 2022), Spelling P (Individual, 019, Ghent, 2021), Standing but Not Operating (Coletiva, La Casa Encendida, Madrid, 2024), Cultivo (Coletiva, Galeria Matsumoto, São Paulo, 2021), 2045 (Coletiva, Palais de Beaux Arts, Paris, 2021). Rosa Rosa Rosae Rosae (Coletiva, Maison Pilgrims, Bruxelas, 2021), Biblioteca Floresta (Coletiva, SESC Belenzinho, São Paulo, 2021) e L’intolérable ligne droite (Coletiva, Galerie Art & Essai, Rennes, 2019).

Sobre a curadora

Fernanda Morse (Niterói, Rio de Janeiro, Brasil, 1996) vive e trabalha entre São Paulo, Brasil, e Paris, França. Concluiu a graduação e o mestrado em Teoria Literária na Faculdade de Letras da USP, com período sanduíche na Université Paris-Sorbonne. Atua entre o universo das letras e das artes, desenvolvendo trabalhos em pesquisa, tradução e curadoria. Tem textos críticos, literários e traduções publicados em diversas revistas, tais como: Rosa, Cult, Escamandro, Select, A Palavra Solta e Ruído Manifesto. Em 2024, publicou a tradução do livro Alma material, da crítica de arte francesa Émilie Notéris (Belo Horizonte, Ayiné). Em 2022, organizou e traduziu a antologia Poemas mais ou menos de amor e outros poemas, da poeta estadunidense Diane di Prima (São Paulo, Edições Jabuticaba). Tem duas plaquetes de poesia publicadas: a primeira pela Coleção Kraft, da editora Cozinha Experimental (Rio de Janeiro, 2014); a segunda intitulada Impossíveis, pelo selo Cactus (São Paulo, 2015).

Sobre a Galatea

Sob o comando dos sócios Antonia Bergamin, Conrado Mesquita e Tomás Toledo, a Galatea conta com dois espaços vizinhos na cidade de São Paulo: a unidade localizada na Rua Oscar Freire, 379 e a nova unidade localizada na Rua Padre João Manoel, 808. A galeria também tem uma sede em Salvador, na Rua Chile, 22, no centro histórico da capital baiana.

A Galatea surge a partir das diferentes e complementares trajetórias e vivências de seus sócios fundadores: Antonia Bergamin, que foi sócia diretora de uma galeria de grande porte em São Paulo; Conrado Mesquita, marchand e colecionador especializado em descobrir grandes obras em lugares improváveis; e Tomás Toledo, curador que contribuiu para a histórica renovação institucional do MASP, saindo em 2022 como curador chefe.

Com foco na arte brasileira moderna e contemporânea, trabalha e comercializa tanto nomes consagrados do cenário artístico nacional quanto novos talentos da arte contemporânea, além de promover o resgate de artistas históricos. Idealizada com o propósito de valorizar as relações que dão vida à arte, a galeria surge no mercado para reinventar e aprofundar as conexões entre artistas, galeristas e colecionadores.

Adiar a ordem

Local: Galatea

Endereço: Rua Oscar Freire, 379, loja 1 – Jardins, São Paulo – SP

Abertura: 11 de fevereiro, 18h às 21h

Período expositivo: 12 de fevereiro a 8 de março de 2025

Horários:  Terça a quinta das 10h às 19h; sexta das 10h às 18h; sábado das 11h às 17h

Mais informações: https://www.galatea.art/

Instagram: @galatea.art_.

(Com Edgard França/A4&Holofote Comunicação)