O texto crítico da exposição é assinado por Clarissa Diniz, curadora, pesquisadora e importante divulgadora do trabalho de Montez nos últimos anos. O ensaio de Diniz integra o livreto da mostra, que também traz a reedição inédita de um ensaio publicado por Montez em 1978, intitulado A forma popular construtivista. As ideias defendidas no texto do artista se materializam na série Barracas do Nordeste (1972-1993), um dos pilares da exposição.
A mostra se divide em dois eixos e ocupa os dois espaços da Galatea: na Rua Oscar Freire estão concentradas as pinturas de grande formato, pouco exploradas em exposições recentes do artista. São 22 trabalhos que se baseiam em tradições estéticas alternativas a paradigmas eurocentrados, dialogando com o que o artista chamou de ‘arte popular geométrica’. Este eixo inclui obras das séries Barracas do Nordeste e Portas de Taquaritinga (1983), além de peças que refletem o interesse de Montez pelo zen-budismo e hinduísmo, como a série Tantra (1963-2006).
Já na Rua Padre João Manuel, em meio a 30 obras estão expostas três pinturas da série Morandi (1964/1972/2000) e trabalhos abstratos criados tanto no período inicial de sua produção, como a pintura Abstração Geométrica (1957), quanto em sua maturidade, como a série Teares de Timbaúba (1979-1998), além de uma seleção de obras em torno das práticas e investigações conceituais, textuais e cartográficas de Montez.
Segundo o curador Tomás Toledo, “Montez Magno é uma artista que se define por sua polifonia. Sua produção artística e intelectual altamente sofisticada, que misturava referências eruditas e populares, por muito tempo foi marginalizada pelo meio artístico sudestino e agora passa a ganhar o merecido destaque, como foi visto em sua individual na pinacoteca do São Paulo em 2023. A exposição Montez Magno: entre Morandi, Nordeste e Tantra, que ocorre nos dois espaços da Galatea em São Paulo, apresenta e celebra justamente toda a polifonia e multiplicidade do artista.”
O título da mostra faz referência tanto a séries de trabalhos que são apresentados quanto a três universos que compuseram o imaginário de Montez Magno. Há as pinturas que partem da admiração de Montez pelo pintor italiano Giorgio Morandi (1890–1964) e que representam a sua prática de comentar outros artistas e de citar as vanguardas europeias; há o Nordeste, referência ao seu contexto de vida e à série Barracas do Nordeste (1972-1993), baseada nas geometrias vernaculares; e, por fim, Tantra, referência a um conjunto de trabalhos que exploram com originalidade o universo da filosofia tântrica e os ensinamentos de matrizes de pensamento não ocidentais.Clarissa Diniz, em seu texto crítico, reflete sobre a influência de Morandi na obra de Montez: “No encontro de Montez com [Giorgio] Morandi, o pernambucano elaborou percepções que se tornaram definidoras de parte significativa de suas concepções poéticas, estéticas e políticas acerca da prática artística. Foi observando a pintura morandiana que, esgarçando a funcionalidade representativa da tradição das naturezas-mortas, Magno compreendeu que o caráter contemplativo da arte acontecia também para além da geometria ou da construção.”
Montez Magno: entre Morandi, Nordeste e Tantra ainda apresenta duas propostas diversas no âmbito da expografia: na Oscar Freire, as pinturas de grande formato são fixadas em estruturas que se inspiram nas criações dos arquitetos e designers italianos Franco Albini, Carlo Scarpa e Lina Bo Bardi. Já na unidade da Padre João Manuel, o ambiente convida a uma experiência intimista, e a expografia de caráter mais convencional permite que a arquitetura brutalista da nova unidade da galeria sobressaia.
Sobre o artista
Timbaúba, PE, 1934 – 2023, Recife, PE
Montez Magno nasceu no município de Timbaúba, mas mudou-se com a família para Recife, Pernambuco, ainda em 1934. Entre 1940 e 1942, estudou no Grupo Escolar João Barbalho. Em 1950, escreveu seus primeiros poemas e, em 1954, ingressou na Escola de Belas Artes do Recife, onde realizou o curso livre de paisagem e desenho artístico ministrado por Mário Nunes (1889–1982). Em 1957, mudou-se para Olinda, onde estabeleceu seu ateliê na Rua de São Bento, 358. Aproximou-se do artista Aloísio Magalhães (1927–1982) e realizou sua primeira exposição individual na galeria do Instituto dos Arquitetos do Brasil, em Recife. Em 1959, integrou o grupo de artistas da 5ª Bienal de São Paulo, no MAM-SP.
O artista também estudou litografia com o desenhista e gravador Darel Valença (1924–2017). Montez viajou para Madri, na Espanha, por meio de uma bolsa de estudos concedida pelo Instituto de Cultura Hispânica de Madri. Com isso, teve a oportunidade de conhecer vários países da Europa; entre eles a Itália, que visita em 1964 tanto para apreciar a Bienal de Veneza quanto para seguir o rastro de Giorgio Morandi na cidade de Bolonha.
Em 2011, em comemoração aos 55 anos de carreira de Montez Magno, o Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães — MAMAM, no Recife, realizou uma retrospectiva de sua obra que abarcou 150 trabalhos entre desenhos, pinturas, gravuras, poesias visuais, objetos, fotomontagens, livros, instalações, performances e música. Em 2023, a Pinacoteca de São Paulo abriu, logo antes da morte do artista, uma exposição panorâmica que reuniu um conjunto de mais de 80 trabalhos de sua autoria. Suas obras podem ser encontradas em diversas coleções permanentes, tais como: Museu de Arte do Rio – MAR, no Rio de Janeiro; Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães – MAMAM, em Recife; Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo – MAC USP, em São Paulo; e Pinacoteca de São Paulo.
Galatea e o novo espaço
Sob o comando dos sócios Antonia Bergamin, Conrado Mesquita e Tomás Toledo, a galeria escolheu uma pérola da arquitetura brutalista, o edifício Thais, projetado em 1978 pela arquiteta Maria Luiza Correa e localizado na Rua Padre João Manoel, para abrigar a nova sede. Com reforma assinada pelo Kas Arq e paisagismo por Paula Bergamin, o espaço soma 430 m² e ocupa o térreo e o primeiro pavimento do prédio com salão expositivo, viewing room, escritório e acervo.
O arquiteto Klaus Schmidt comenta: “O projeto resgata a arquitetura brutalista do edifício, tirando proveito da sua bela estrutura em concreto aparente. Desenhamos o espaço de forma a ganhar paredes e criar um percurso de chegada à galeria sem restringir sua flexibilidade expográfica. O jardim interno e os longos bancos em granilite conferem singularidade ao salão expositivo e funcionam como espaços de contemplação e convivência. Salas de apoio, trabalho e reunião foram concentradas no andar superior.”
Paula Bergamin, responsável pelo paisagismo do novo espaço, destaca: “O projeto foi desenvolvido para harmonizar e valorizar a arquitetura brutalista do prédio. Penso que o concreto aparente pede um jardim com muito verde, textura e força. Por isso investi nas plantas tropicais com as suas folhas volumosas. Além disso, pratico um tipo de paisagismo que se chama ecogênese e sempre busco priorizar as espécies nativas. Neste projeto, usei 90% de plantas nativas, com destaque para os palmitos-juçara e uma variedade de philodendrons, alocasias e samambaias.”
Somando-se a unidade localizada na rua Oscar Freire, o novo local configura uma expansão substancial da galeria, que passa a ter dois espaços expositivos na cidade de São Paulo, além da sede em Salvador.
A Galatea surge a partir das diferentes e complementares trajetórias e vivências de seus sócios-fundadores: Antonia Bergamin, que foi sócia-diretora de uma galeria de grande porte em São Paulo; Conrado Mesquita, marchand e colecionador especializado em descobrir grandes obras em lugares improváveis; e Tomás Toledo, curador que contribuiu para a histórica renovação institucional do MASP, saindo em 2022 como curador-chefe.
Com foco na arte brasileira moderna e contemporânea, trabalha e comercializa tanto nomes consagrados do cenário artístico nacional quanto novos talentos da arte contemporânea, além de promover o resgate de artistas históricos. Idealizada com o propósito de valorizar as relações que dão vida à arte, a galeria surge no mercado para reinventar e aprofundar as conexões entre artistas, galeristas e colecionadores.
Serviço:
Montez Magno: entre Morandi, Nordeste e Tantra
Local: Galatea
Endereço: Rua Padre João Manuel, 808 – Jardins, São Paulo – SP | R. Oscar Freire, 379 – Jardim Paulista – São Paulo – SP
Abertura: 29 de agosto | 18h às 21h
Período expositivo: 29 de agosto a 21 de setembro
Horários: segunda à quinta das 10h às 19h; sexta das 10h às 18h e sábado, das 11h às 15h
Mais informações: https://www.galatea.art/.
(Fonte: Bruna Lira/A4&Holofote Comunicação)