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Galeria Estação celebra 20 anos com exposição coletiva no Instituto Çarê, em São Paulo

São Paulo, por Kleber Patricio

Obra de Mirian Inêz da Silva Cerqueira. Fotos: João Liberato.

A mostra coletiva Cotidiano, imaginação e paisagem: Galeria Estação, 20 anos abre no dia 3 de agosto de 2024 (sábado), das 11h até 15h, no Instituto Çarê, na Vila Leopoldina, em São Paulo. O convite para a realização do evento foi feito pelo Instituto Çarê, instituição cultural parceira da galeria desde 2023.

Curada por Taisa Palhares, a exposição tem obras dos artistas brasileiros históricos Antônio Poteiro (1925–2010), Izabel Mendes da Cunha (1924–2014), José Antônio da Silva (1909–1996), José Bezerra, Júlio Martins (1893–1978), Mirian Inêz da Silva (1948–1996), Nino (1920–2002) e Noemisa (1947–2024).

O evento celebra a importância da Galeria Estação no cenário da arte nacional, relacionada à revalorização ou mesmo a descoberta de criadores que permaneceram à margem do sistema institucionalizado da arte, mas cujas obras carregam um espírito contemporâneo.

Obra de José Antonio da Silva.

Além do caráter histórico de reunir um grupo de artistas vivos e já falecidos, há similaridade no que diz respeito ao conteúdo temático das obras, com a presença marcante da relação entre o homem e o meio natural, do trabalho rural, do artesanato, das figuras religiosas e do imaginário das festas populares. “A presente exposição celebra a atuação da colecionadora e galerista Vilma Eid, que nas últimas duas décadas tem se dedicado a apresentar ao público artistas brasileiros por muito tempo subvalorizados por não pertencerem ao cânone erudito da história da arte. Trata-se, em geral, de homens e mulheres de origem modesta, que desenvolveram seus trabalhos artísticos de maneira autodidata e longe dos grandes centros urbanos, criando um universo imaginativo próprio a partir da vivência da cultura popular, das atividades laborais tradicionais e da religiosidade”, afirma a curadora Taisa Palhares.

Parceria

Esta não é a primeira vez que o Instituto Çarê e a Galeria Estação trabalham juntos, mas em outra ocasião, o artista visual Santidio Pereira (representado pela galeria) participou da mostra coletiva Nossa Vizinhança, que aconteceu no evento Ocupação Çarê: Território Emboaçava, em setembro de 2023. O Instituto Çarê foi fundado pela artista visual Elisa Bracher, em parceria com Ana Cristina Cintra, que tem como principal objetivo a busca, a divulgação e a preservação da cultura brasileira. “Minha trajetória no mercado da arte começou em 1984, quando fui convidada por Paulo Vasconcellos e Torquato Pessoa para ser sócia da galeria que levava o nome do Paulo. Também apaixonado pela arte brasileira, dos eruditos aos não eruditos, ele foi meu mestre. Depois que a galeria fechou, tive um escritório de arte; até que, em 2004, eu e meu filho Roberto inauguramos a Estação. Comemoramos os vinte anos de atuação da galeria com esta exposição especial no Instituto Çarê. Especial porque fala de arte e de amizade”, diz a fundadora e diretora artística da Galeria Estação, Vilma Eid.

Sobre a Galeria Estação

Obra de Júlio Martins.

Fundada no ano de 2004 em São Paulo, Brasil, a Galeria Estação inaugurou um programa curatorial atendendo a uma ampla comunidade de vozes artísticas não canônicas ao criar pontes transgeracionais entre artistas contemporâneos emergentes e autodidatas pioneiros.

A Galeria Estação inspirou uma rede integradora de figuras criativas e criadores de diversas geografias e formações educacionais. Desde 2008, o programa artístico inovador da galeria, instalado em um edifício arquitetônico, exibe artistas brasileiros contemporâneos cujas origens culturais e práticas vernáculas complementam a primazia da arte autodidata – examinando os estilos artísticos sub-representados do país, trabalhando métodos e narrativas históricas ou até legados.

A diretora artística e fundadora da Galeria Estação, Vilma Eid, em colaboração com um distinto grupo de curadores convidados, propuseram diálogos em apresentações que transcenderam os relatos tradicionais do desenvolvimento de gêneros abstratos e figurativos nos séculos XIX e XX, iniciando explorações que questionam o que significa constituir o passado e o presente da arte brasileira.

Obra de Izabel Mendes da Cunha.

Como resultado, a Galeria Estação é uma referência no Brasil e internacionalmente, uma força para a preservação de memórias e narrativas latino-americanas de outra forma descartadas, marginalizadas ou negligenciadas nas historiografias da arte brasileira.

Foi por meio desses e outros fatores que a Galeria Estação se tornou referência em obras únicas e com uma variedade de vertentes artísticas do Brasil, continuando também a sua missão de oferecer oportunidades sem precedentes para que os espectadores experimentem visões expansivas da arte brasileira – visões essas tanto locais quanto globais.

A Galeria Estação exibe um grande grupo de artistas históricos: Agnaldo dos Santos, Agostinho Batista de Freitas, Amadeo Luciano Lorenzato, Artur Pereira, Chico da Silva, Chico Tabibuia, Conceição dos Bugres, Elza O.S, Geraldo Teles Oliveira – G.T.O, Gilvan Samico, Heitor dos Prazeres, Itamar Julião, Izabel Mendes da Cunha, José Antonio da Silva, Madalena dos Santos Reinbolt, Maria Auxiliadora, Mirian Inêz da Silva, Sebastião Theodoro Paulino da Silva – Ranchinho e Zica Bergami. A crescente lista de artistas contemporâneos inclui André Ricardo, Deni Lantz, Eduardo Ver, Higo José, José Bezerra, Julio Villani, Rafael Pereira, Renato Rios, Santídio Pereira, Cicero Alves dos Santos  – Véio. www.galeriaestacao.com.br

Sobre o Instituto Çarê | Organização sem fins lucrativos e centro cultural aberto à cidade, o Instituto Çarê foi criado em 2019 com a missão de colaborar com o bem-estar e divulgar a obra de músicos brasileiros de grande importância, dar centralidade à cultura que escapa do radar do mercado, formar acervos, apoiar pesquisas em campos negligenciados, salvaguardar patrimônios relevantes e oferecer à população do entorno um ambiente de trocas rico e inclusivo. Organiza-se em núcleos de ação coordenada nos campos de educação, com projetos de educação ambiental e fortalecimento de comunidades; música, focado em difundir manifestações relevantes; artes visuais, voltado a fomentar poéticas novas e formar públicos; pesquisa, que investe na ampliação da base de dados sobre populações minorizadas para subsidiar políticas públicas, e acervo, que protege, qualifica e dá acesso a coleções que preservam trechos da história da cultura brasileira.

Sobre a curadora

Taisa Palhares é professora de Estética no Departamento de Filosofia do IFCH-Unicamp. Possui graduação (1997), mestrado (2001) e doutorado em Filosofia (2011) pela Universidade de São Paulo (USP). Realiza estudos nas áreas de Teoria Crítica, Estética e Artes Visuais, com ênfase na pesquisa sobre a fundamentação da obra de arte desde a Modernidade. Foi curadora da Pinacoteca do Estado (São Paulo) de 2005 a 2015, onde organizou diversas exposições e cursos, entre eles a mostra retrospectiva itinerante Mira Schendel (2013-2014), em parceria com a Tate Modern (Londres). Recebeu o Prêmio Jabuti (2011), na categoria Livro Didático e Paradidático, pela idealização e organização do livro Arte Brasileira na Pinacoteca do Estado de São Paulo (São Paulo: Cosac Naify, Imprensa Oficial, 2010). Publicou o livro Aura: a crise da arte em Walter Benjamin com auxílio da Fapesp (São Paulo: Editora Barracuda, Fapesp, 2006). Realizou a curadoria da exposição Murilo Mendes, poeta crítico: o infinito íntimo, com Lorenzo Mammì e Maria Betânia Amoroso, no Museu de Arte Moderna de São Paulo (2023). A mostra foi premiada em 2024 na categoria Melhor Exposição Nacional – 2023 pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). É coordenadora do GT de Estética da ANPOF (2023-2024). Atualmente é coordenadora de graduação do curso de Filosofia da Unicamp e organiza o Grupo de Estudos em Estética e Teoria da Arte (GEETA).

Sobre os artistas:

Antônio Poteiro [Antônio Batista de Souza] (Santa Cristina da Posse/PT, 1925 – Goiânia/BR, 2010) Chegou criança ao Brasil, onde viveu em São Paulo, Minas Gerais e entre os índios carajás, na ilha do Bananal, fixando-se em Goiânia em 1955. Foi cisterneiro, padeiro, cozinheiro e faxineiro antes de iniciar-se na arte do barro com o pai, o ceramista Américo de Souza, que fazia potes e utensílios – daí o apelido Poteiro. Desejoso de dar outras formas à matéria, passa a esculpir santos, urnas, animais sagrados e sonhos. Em 1973, animado por Siron Franco, inicia-se na pintura, somando temas religiosos e crítica política: em uma Última Ceia, a mesa é decorada com notas de dólar e libra. Suas obras estiveram na Bienal de São Paulo em 1981 e 1991 e foram vistas em mais de vinte países.

Izabel Mendes da Cunha (Itinga-MG, Brasil, 1924-2014) Filha de paneleira e lavradora, casada com um vaqueiro, começou nos anos 1970 a produzir seu figurado inicial, com bois, cavaleiros, passarinhos pousados em galhos e pequenos presépios, que recebiam engobo de barro branco. A partir de 1978, cria as noivas e noivos, mulheres amamentando, matronas e moças de grande formato que a notabilizaram. Com tons de barro diversos, confere extraordinária expressão às fisionomias caboclas, brancas ou negras. Vendendo a compradores do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo, foi a única artista do Vale do Jequitinhonha a alcançar preços minimamente justos para seu trabalho. Participou de exposições nas capitais do Sudeste desde os anos 1980, e seu trabalho está representado nos principais museus de arte popular do país.

José Antônio da Silva (Sales de Oliveira (SP), 1909 – São Paulo, 1996) Filho do carreiro de bois, só começou a pintar aos 37 anos. Antes, lutou para sobreviver em serviços árduos no interior de São Paulo.

Casado e com filhos, começou a fazer desenhos a lápis. Em 1946, vivendo em São José do Rio Preto e trabalhando como garçom, vence concurso da Casa de Cultura com Boizinhos, óleo pintado em flanela. Pouco depois, participa de bienais de São Paulo e ganha uma sala especial na Bienal de Veneza. Quarenta anos no meio rural deixaram forte marca em sua pintura, na qual predomina a paisagem e o homem entregue às lides do campo. Em 1975 estabeleceu ateliê em São Paulo. Sua obra foi tema do curta-metragem Quem não conhece o Silva?, de Carlos Augusto Calil (1978) e de retrospectiva no Museu de Arte Contemporânea da USP.

José Bezerra (Buique (PE), Brasil, 1952-) Nascido entre o sertão e o agreste, foi lavrador, trabalhador braçal e carreiro. Matou bichos para comer e derrubou árvores para fazer lenha, o que hoje tenta expiar pela arte. Há dez anos sonhou que era chamado a fazer suas esculturas. Passou a olhar as madeiras que o cercavam e a intervir nelas. Não esculpe de forma tradicional, trabalhando um bloco de madeira para alcançar uma forma definida; procura ver a figura que se insinua no lenho – em geral, umburana – e trazê-la à tona com a intervenção rude de facão, grosa, formão e serrote. A expressividade angulosa de seus trabalhos vem da compreensão de que o próprio meio que contribuiu para seu surgimento, a região do Vale do Catimbau, está prestes a ser posto abaixo pela mudança acelerada nas relações econômicas do país.

Júlio Martins [Júlio Martins da Silva] (Icaraí (RJ), Brasil, 1893 – Rio de Janeiro, Brasil (1978) Cresceu na roça, mas mudou-se com a família para o Rio de Janeiro após a morte do pai. Desde garoto, gostava muito de poesia. Jovem, frequentava teatros e cafés-concertos. Passa por diversos empregos antes de tornar-se cozinheiro no Hotel Avenida. Começou a pintar com lápis crayon aos 29 anos. Aposentado, morando no morro União, em Coelho da Rocha (RJ), passa a se dedicar exclusivamente às telas, agora usando tinta a óleo. Pinta essencialmente paisagens, a partir de atentos estudos de folhas, árvores, pássaros, flores, gestos, vestimentas, animais; as figuras humanas se fundem harmoniosamente em seu halo verde. Se tudo é delicadeza, idílio, euforia, às vezes repassada por uma ponta de humor, o pintor não se furta a expor a angústia histórica do seu tempo.

Mirian Inêz da Silva (Trindade (GO), Brasil, 1948 – Rio de Janeiro, Brasil, 1996) A obra da artista reflete vivências diversas, da cultura popular do interior brasileiro e das sociedades metropolitanas, permeadas pela cultura de massa. Depois de cursar a Escola Goiana de Artes Plásticas, estudou pintura com Ivan Serpa no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro. Começou como gravadora, explorando a visualidade do cotidiano; reconhecida imediatamente pelo circuito institucional, participou das bienais de São Paulo em 1963 e 1967. Abandona a xilogravura no final dos anos 1960 e, em 1970, realiza sua primeira mostra de pinturas.

Voltada a aspectos da sociabilidade no meio rural e na cidade, sua obra volta-se ao que é vivo, festivo, pulsante e corriqueiro, e revela a preocupação com uma certa brasilidade, buscada na natureza e na cultura.

Nino [João Cosmo Felix] (Juazeiro do Norte (CE), Brasil, 1920 – 2002) Antes de dedicar-se à escultura em madeira, começando por brinquedos, cortou cana-de-açúcar e trabalhou como ferreiro. Em 1974 fazia animais de madeira com caudas de imburana, cambão ou timbaúba. Na década de 1980 dá o grande salto para esculturas de dimensão maior, de 1 metro de altura ou mais. No monobloco de madeira, esculpe em alto-relevo ou recorta pássaros, elefantes, bois, macacos, casamentos e reisados, que pinta com cores temperadas por ele. Já expôs individualmente no Rio de Janeiro e em coletivas como Brésil, Arts Populaires (Grand Palais, Paris, 1987) e Mostra do Redescobrimento (Oca, São Paulo, 2000). Sua obra integra importantes coleções públicas e privadas no Brasil e no exterior. Analfabeto, viveu em Juazeiro do Norte até a morte.

Noemisa [Noemisa Batista dos Santos]  (Caraí (MG), Brasil, 1947 – 2024) Muito jovem aprende a modelar o barro com a mãe, Joana, paneleira, que introduziu em Caraí a ‘moringa-mulher de três bolas’, vasilha para água com tampa de cabeça feminina e base tripartida. Diferentemente da mãe e da avó, começa esculpindo figuras e compõe uma verdadeira crônica da vida de seu bairro ao reproduzir batizados, casamentos, moços dirigindo carros. Sua arte é feminina, com delicadas aplicações de barro claro nos vestidos, na decoração das capelas, nas toalhas das mesas. Suas esculturas estiveram na exposição Brésil, Arts Populaires (Grand Palais, Paris, 1987) e na Mostra do Redescobrimento (Oca, São Paulo, 2000) e integram acervos importantes de arte popular. Uma das artistas mais originais da arte cerâmica brasileira, vive isolada e em condições econômicas difíceis.

Serviço:

Mostra coletiva Cotidiano, imaginação e paisagem: Galeria Estação, 20 anos

Curadoria: Taisa Palhares

Parceria: Instituto Çarê

Abertura: 3/8/24 (sábado), 11h até 15h

Visitação: até 31/8/2024 | de terça a sábado, das 13h às 18h

Local: Instituto Çarê

Rua Doutor Avelino Chaves, 138 – Vila Leopoldina, São Paulo – SP

www.institutocare.org.br

Redes sociais: Galeria EstaçãoInstituto ÇarêTaisa Palhares.

(Fonte: Marmiroli Comunicação)