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Mostra explora a revisitação do passado como forma de imaginar um futuro mais justo, utilizando símbolos de resistência e ancestralidade. Fotos: Divulgação.
Identidade. Memória. Esquecimento. Quais histórias escolhemos lembrar e quais preferimos esquecer? Esse é o ponto de partida da exposição ‘Re-Utopya’, primeira individual de Hal Wildson em São Paulo, que entra em cartaz no dia 15 de março na Galeria Lume. Com texto curatorial de Lucas Albuquerque, a mostra tem origem no Prêmio Breeze, no qual Wildson foi contemplado em 2024 e cuja exposição homônima foi apresentada na Embaixada do Brasil em Londres. Agora, na Galeria Lume, ‘Re-Utopya’ ganha novas obras e expografia, enquanto o artista constrói narrativas que questionam os projetos de identidade e apagamento que moldam a história oficial do Brasil, dissolvendo as fronteiras entre arquivo e memória.
Hal Wildson nasceu em Barra do Garças, no Mato Grosso, um território marcado pelas violentas narrativas provenientes do garimpo ilegal e dos conflitos com populações indígenas. É dessa terra e dessas histórias que nascem suas obras, profundamente enraizadas na memória e nas feridas de seu povo. As cores vermelho e preto, recorrentes em sua produção, aludem ao urucum e ao carvão, elementos amplamente usados pelos povos indígenas latino-americanos, conectando passado e presente em uma simbologia carregada de resistência e ancestralidade.
Na série Utopia Original, produzida por datilografia e carimbos em páginas de livros, Wildson retrata movimentos de levante conduzidos por grupos historicamente marginalizados, resgatando episódios de luta que frequentemente são esquecidos ou omitidos pela história. Esses trabalhos propõem uma reflexão urgente: qual Brasil nossa geração está escolhendo escrever?
A Re-Utopya de Wildson pode ser interpretada como a capacidade de recriar, redesenhar e reestruturar o desejo de sonhar. As obras da exposição convidam o visitante a olhar para o passado e refletir sobre os caminhos que não desejamos mais seguir, ao mesmo tempo em que evocam o potencial de imaginar futuros mais justos.
Com uma linguagem estética que dialoga com a terra e com o corpo, Wildson reescreve histórias de resistência e memória coletiva ao mesmo tempo que questiona seus apagamentos, como mostra na série Anistia da Memória, onde fotografias de atos golpistas de diferentes épocas se misturam impressas em borrachas escolares, usadas pelo artista até quase sumirem por completo, em representação física da anistia de nosso país e da resistência à verdade. Em um momento em que, ainda hoje, muitos flertam com o fascismo e caminham livremente fazendo ode a torturadores, Hal Wildson acusa, aponta caminhos, denuncia e se junta a um panteão de artistas a gritar contra regimes e táticas totalitárias que insistem no apagamento e em mentiras descaradas. Algo que segue mais atual que nunca.
Re-Utopya de Hal Wildson é um convite a revisitar nossas memórias, reavaliar nossos esquecimentos e reimaginar nossas utopias. Citando o artista, “é na memória que plantamos a semente do futuro”.
Sobre o artista:
Hal Wildson
Barra do Garças – MT, 1991. Vive e trabalha em São Paulo.
Artista multimídia e poeta, nascido em 1991 no vale do Araguaia, região de fronteira entre Goiás e Mato Grosso, lugar determinante para entender a essência e as motivações de seu trabalho. Sua pesquisa emerge de sua vivência no sertão do centro-oeste, marcado pela configuração de sua família mestiça e marginalizada, o artista investiga a construção do Brasil confrontando os projetos de identidade, memória e esquecimento que sustentam a história oficial, na medida em que busca resposta sobre a própria origem. Nascido em uma estrutura familiar moldada pela violência e o abandono, a história e o trabalho do artista se misturam denunciando temas de um Brasil ‘esquecido’ fruto do coronelismo e do garimpo às margens do Rio Araguaia.
Desdobrando-se sobre o conceito de memória-esquecimento, identidade e a ‘escrita-reescrita’ da história o artista se apropria de objetos simbólicos oficiais e de processos de documentação que foram utilizados nas últimas décadas (como a datilografia, datilograma, carteiras de identidades, carimbos) materiais e processos técnicos utilizados para documentar o oficial e, portanto, capazes de forjar a mitologia e a história de um país e marcar a individualidade. Em sua pesquisa multidisciplinar, transitando entre a pintura datilográfica, a infogravura, instalação, videoarte e a criação de objetos, Hal Wildson se utiliza dos recursos de documentação do oficial para questionar os projetos de ‘memória e esquecimento’ aplicados como políticas de controle social, seu trabalho ousa confrontar e disputar o poder do simbólico como alternativa de criar realidades mais justas.
Sobre a Galeria Lume
A Galeria Lume foi fundada em 2011 com a proposta de fomentar o desenvolvimento de processos criativos contemporâneos ao lado de seus artistas e curadores convidados. Dirigida por Paulo Kassab Jr. e Victoria Zuffo, a Lume se dedica a romper fronteiras entre diferentes disciplinas e linguagens, através de um modelo único e audacioso que reforça o papel de São Paulo como um hub cultural e cidade em franca efervescência criativa.
A galeria representa um seleto grupo de artistas estabelecidos e emergentes, dedicada à introdução da arte em todas as suas mídias, voltados para a audiência nacional e internacional, através de um programa de exposições plural e associado a ideias que inspiram e impulsionam a discussão do espírito de época. Foca-se também no diálogo entre a produção de seus artistas e instituições, museus e coleções de relevância.
A presença ativa e orgânica da galeria no circuito resulta na difusão de suas propostas entre as mais importantes feiras de arte da atualidade, além de integrar e acompanhar também feiras alternativas. A galeria aposta na produção de publicações de seus artistas e realização de material para pesquisa e registro. Da mesma forma, a Lume se disponibiliza como espaço de reflexão e discussão. Recebe palestras, performances, seminários e apresentações artísticas de natureza diversa.
Serviço:
Re-Utopya, de Hal Wildson
Texto curatorial de Lucas Albuquerque.
Local: Galeria Lume
Abertura: 15 de março, sábado, das 11h às 17h
Período expositivo: 15 de março de 2025 a 26 de abril de 2025
Horário de visitação: Segunda a sexta, das 10h às 19h; sábados, das 11h às 15h
Endereço: Rua Gumercindo Saraiva, 54 – Jardim Europa, São Paulo – SP
Entrada gratuita
Informações para o público: tel.: 55 (11) 4883-0351
WhatsApp: (11) 93281-3346
e-mail: contato@galerialume.com
www.instagram.com/galerialume/
(Com Isabella Boyadjian/Galeria Lume)