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Instituto Moreira Salles lança ebook gratuito ‘Música e modernismos negros’

São Paulo, por Kleber Patricio

O Instituto Moreira Salles acaba de lançar o e-book Música e modernismos negros, já disponível para acesso e download gratuitos. Tendo como ponto de partida a Semana de Arte Moderna de 1922, cujo centenário foi comemorado em 2022, a publicação reúne dez ensaios que propõem perspectivas alternativas e contemporâneas acerca da experiência negra no país, bem como sobre a história da cultura brasileira. Dividido em quatro capítulos, o material aborda temáticas como memória, racismo, religiosidade e silenciamentos.

O e-book é um desdobramento da série de encontros Música e modernismos negros: formação a partir do acervo IMS, realizados virtualmente em 2022. Organizada pelo historiador e etnomusicólogo Rafael Galante e pela diretora de educação do IMS, Renata Bittencourt, a publicação é fruto de projetos de pesquisa comissionados pelo IMS, a partir de temas representados em seu acervo.

O projeto evidencia a importância dos modernismos negros como expressões artísticas e culturais de resistência. O conteúdo reflete sobre a centralidade da diáspora africana na formação da identidade brasileira e suas repercussões na sociedade atual. De acordo com Rafael Galante, “os leitores serão convidados a conhecer não apenas o impacto artístico de indivíduos notáveis, mas também a compreender as complexas questões enfrentadas pelos artistas negros em um país que em grande medida ignorou (ou silenciou) suas vozes e suas contribuições”.

O e-book, assim como as lives que lhe deram origem, podem ser adotados como fonte de referência para pesquisadores e professores, contribuindo para reforçar o cumprimento da lei 10.639/03, que determina a abordagem da história e da cultura afro-brasileira no ensino escolar.

Sobre os textos do e-book

O primeiro capítulo da publicação, Vozes pretas e formas musicais africanas, reúne dois ensaios que destacam o papel da música como um veículo de memória e saberes coletivos. Em 78 RPM: revoluções pretas macumbistas, a cantora, intérprete e professora Fabiana Cozza traz a importância da música e da oralidade na expressão cultural negra no Brasil. No texto, a autora destaca artistas como Zé Espinguela, João da Baiana e Getúlio Marinho, que, por meio de suas canções e práticas, refletem uma experiência comunitária e ancestral.

Em Os sambas e a modernidade negra no Brasil de Mário de Andrade, o músico e historiador Salloma Salomão Jovino da Silva apresenta a modernidade negra no Brasil como um fenômeno cultural que, apesar da repressão e da invisibilidade promovidas por elites brancas, continua a se manifestar por meio de práticas musicais como o samba e revela a resistência e a riqueza da cultura afro-brasileira em meio a um contexto de exclusão e estigmatização.

O segundo núcleo do e-book aborda aspectos da produção cultural negra no Rio de Janeiro entre o final do século XIX e o início do XX, dentro do recorte de temáticas como Racismo, gênero e visualidades. Em Modernismos, modernidades negras e racismo na história da música brasileira, Martha Abreu, professora do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense, aponta o silenciamento do protagonismo dos músicos negros no campo musical expresso em capas de partitura. A autora explora dois episódios ocorridos no Rio de Janeiro: o primeiro, um encontro entre intelectuais e músicos negros, em 1926, narrado por Hermano Vianna; o segundo, a gravação do samba Pelo telefone, no início de 1917.

Ainda neste capítulo, Juliana da Conceição Pereira, doutora e mestra em história, reflete sobre os modernismos e a modernidade negra a partir das experiências de jovens artistas, investigando a trajetória de mulheres negras atuantes no teatro e na indústria fonográfica entre o final do século XIX e o início do XX. A autora pontua que, apesar do silenciamento, “as mulheres negras atuantes no teatro de revista dialogavam e disputavam os sentidos da modernidade, valorizavam a cultura popular e construíam novas formas de se verem representadas a partir de seus próprios termos”. Já o pesquisador Vinícius Natal analisa a construção histórica que resultou no privilégio de pessoas brancas no ofício de carnavalesco na cidade do Rio de Janeiro.

Política e religiosidade são temas da terceira parte do e-book, que reúne as trajetórias de três dos mais importantes cantautores negros no Brasil do século XX. A curadora Glaucea Helena de Britto assina Poéticas afro-brasileiras na obra de Heitor dos Prazeres, ensaio que aborda a potência criativa e a produção artística multifacetada de Heitor dos Prazeres, sambista, compositor e artista plástico. A partir da análise da composição Pai Benedito e da capa do álbum Macumbas & candomblés, o texto apresenta a dimensão crítica, estética e simbólica do artista, que registrou com maestria as urgências de seu tempo.

As gravações de macumbas por Mano Eloy e o modernismo negro da década de 1930, escrito pela historiadora Alessandra Tavares, expõe como experiências culturais negras estiveram presentes na indústria fonográfica desde seus primórdios, mas tiveram o seu caráter moderno desvalorizado. O texto parte de uma gravação dos pontos de Iansã e de Ogum feita por Eloy Anthero Dias e discorre como a produção de músicos negros foi amplamente secundarizada em nome do exotismo. Ainda neste núcleo, a historiadora Fernanda Epaminondas Soares discorre sobre o pioneirismo e as escolhas políticas de Getúlio Marinho da Silva frente à abertura propiciada pela indústria fonográfica para a gravação de discos do gênero musical ‘macumba’.

No último capítulo do e-book, Lideranças e invisibilidades, os textos trazem a centralidade das comunidades de terreiro e de suas respectivas lideranças na construção das culturas negras urbanas e de suas redes no Rio de Janeiro e em São Paulo na passagem da sociedade escravocrata para o mundo do pós-abolição. Em Religiosidades e (in)visibilidades de mulheres negras no processo histórico dos sambas: de Tia Ciata de Oxum a Madrinha Eunice da Lavapés, a jornalista Claudia Regina Alexandre destaca a participação criativa, os papéis de liderança e o protagonismo de mulheres negras na construção do universo do samba. O texto evidencia valores culturais negro-africanos como musicalidade, religiosidade e sociabilidade para acessar algumas memórias ocultas na literatura da música popular brasileira.

Em Nosso Sagrado, o acervo afro-carioca em diálogo com instituições: as casas de umbanda e candomblé como espaços de ensinamentos, Eduardo Possidonio, doutor em história social, aponta como não apenas os objetos de religiosidade afro-carioca presentes em acervos de instituições museológicas, mas também a produção de artistas negros dos séculos XIX e XX, servem como base para a pesquisa de compreensão para ritos e escolhas dentro dos espaços sagrados da cidade do Rio de Janeiro.

Serviço:

E-book Música e modernismos negros

Disponível para leitura e download gratuitos no site do IMS e no Issuu.

(Fonte: Com Robson Figueiredo da Silva/IMS)