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Memorial da Resistência coloca ditaduras brasileira e argentina em diálogo com abertura de duas exposições

São Paulo, por Kleber Patricio

Brasil: Nunca Mais/Arquivo Edgard Leuenroth – AEL/Unicamp.

O Memorial da Resistência de São Paulo apresentano dia 7 de setembro de 2024, às 11h, a abertura de duas exposições concomitantes: Uma Vertigem Visionária – Brasil: Nunca Mais e Memória argentina para o mundo: o Centro Clandestino ESMA.

A mostra argentina é uma itinerância realizada pelo Museu Sítio de Memória ESMA – Ex-Centro Clandestino de Detenção, Tortura e Extermínio, em Buenos Aires e explora a história do edifício desde a ocupação pelas Forças Armadas durante a última ditadura argentina (1976–1983) até seu reconhecimento como Patrimônio Imaterial da Unesco, em 2023. As violações de direitos humanos cometidas contra mulheres no período também são revisitadas a partir dos testemunhos das sobreviventes.

Em paralelo, com curadoria do pesquisador e professor Diego Matos, a exposição Uma Vertigem Visionária – Brasil: Nunca Mais é dedicada à memória do projeto homônimo, responsável pela mais ampla pesquisa já realizada pela sociedade civil sobre a tortura no Brasil durante a Ditadura Civil-Militar (1964–1985).

Com as duas mostras, o Memorial explora as últimas ditaduras brasileira e argentina ao apresentar diferentes processos de luta e resistência protagonizados em ambos os países latino-americanos. A partir da história oral, coloca ambas as exposições em diálogo para a construção de uma memória coletiva sobre os períodos de repressão.

A abertura contará com a presença de Mayki Gorosito, diretora técnica do Museu Sítio de Memória ESMA, e do curador Diego Matos.

Uma Vertigem Visionária – Brasil: Nunca Mais

Em 400m², a mostra resgata a memória do projeto Brasil: Nunca Mais, empreendida entre 1979 e 1985. A iniciativa foi responsável por sistematizar e produzir cópias, clandestinamente, de mais de 1 milhão de páginas contidas em 707 processos do Superior Tribunal Militar (STM), revelando a extensão da repressão política do Brasil no período.

A história do projeto e seus desdobramentos é apresentada junto a testemunhos de advogados, jornalistas e defensores de direitos humanos envolvidos no projeto, que, por anos, tiveram seus nomes mantidos no anonimato: Paulo Vannuchi, Anivaldo Padilha, Ricardo Kotscho, Frei Betto, Carlos Lichtsztejn, Leda Corazza, Petrônio Pereira de Souza e Luiz Eduardo Greenhalgh.

O arquivo de 707 processos judiciais expõe os depoimentos de presos políticos sobre as ações de repressão, vigilância, perseguição e tortura do aparato estatal. As cópias desse conteúdo, que por anos foram mantidas em segurança em acervos preservados na Suíça e nos EUA, tiveram repatriamento e retornaram ao Brasil em 2011, onde atualmente encontram-se sob salvaguarda do Arquivo Edgard Leuenroth/Unicamp, em Campinas.

O projeto teve apoio do Conselho Mundial de Igrejas e da Arquidiocese de São Paulo, com participação de Dom Paulo Evaristo Arns (1921–2016), arcebispo de São Paulo, e do Rev. James Wright (1927–1999), da Missão Presbiteriana do Brasil Central.

Além dos arquivos do projeto Brasil: Nunca Mais, a exposição apresenta obras da Coleção Alípio Freire, sob salvaguarda do Memorial da Resistência, realizadas por ex-presos políticos como Artur Scavone, Ângela Rocha, Rita Sipahi, Manoel Cyrillo, Sérgio Ferro, Sérgio Sister e o próprio Alípio Freire durante a permanência em presídios de São Paulo na Ditadura.

Também compõem a mostra obras de arte de artistas como Carmela Gross, Regina Silveira, Artur Barrio, Antonio Manuel, Rubens Gerchman, Claudio Tozzi e Carlos Zílio, do Acervo da Pinacoteca de São Paulo, e obras externas de Rivane Neuenschwander, Claudio Tozzi, Carlos Zilio. Rafael Pagatini apresentará uma obra comissionada para a exposição ocupando um mural de 100m² na área externa do museu.

A exposição também lança luz sobre o tempo presente, oferecendo indícios da importância desse debate hoje na perpetuação das permanentes violências do Estado contra suas minorias e populações vulneráveis.

Memória argentina para o mundo: o Centro Clandestino ESMA

Mãe deposita uma flor em um dos túmulos sinalizados como “NN” (nome desconhecido), no Cemitério Parque de Grand Bourg. Buenos Aires, 31 de outubro de 1982. Foto: Autor desconhecido/Acervo Memoria Abierta.

O lugar de memória, antiga sede da Escola Superior de Mecânica da Armada (ESMA), foi o maior centro clandestino da última ditadura civil-militar argentina (1976–1983), onde foram detidas ou desaparecidas cerca de 5 mil pessoas, entre militantes políticos, estudantes e artistas.

Com dois eixos principais divididos em 210m², a exposição apresenta a história do edifício junto a depoimentos com diferentes histórias de luta, lançando um olhar sobre o passado e conectando-o ao tempo presente e as reinvindicações por justiça, verdade e reparação.

O núcleo Patrimonio do Nunca Mais contém um vídeo institucional sobre a ESMA e seis painéis com textos e imagens que abordam a história do edifício. Já Ser mulheres na ESMA aborda as violências específicas a quais mulheres sofreram durante seus sequestros e detenções, como a maternidade durante a prisão, a solidariedade entre as presas e os caminhos adotados para a recuperação física e psicológica das vítimas.

Ex-Centro Clandestino de Detenção, Tortura e Extermínio. Foto: Divulgação/Museu Sítio de Memória ESMA.

Também compõe o espaço expositivo uma ocupação com fotografias documentais do acervo Memoria Abierta, aliança de organizações argentinas de direitos humanos que promove a memória sobre as violações de direitos no passado recente, ações de resistência e lutas pela verdade e justiça, para refletir sobre o presente e fortalecer a democracia. A fim de apresentar ao público brasileiro a memória visual do período, a ocupação traz registros dos fotógrafos Daniel García, Eduardo Longoni e duas imagens sem autoria definida. Além de reforçar a importância da história oral, a mostra busca valorizar a preservação e a musealização de lugares de memória difícil – em estreito diálogo com a exposição temporária dedicada ao projeto Brasil: Nunca Mais.

Sobre o museu

O Memorial da Resistência de São Paulo é o principal museu de história dedicado à memória política das resistências e da luta pela democracia no Brasil e tem como missão a valorização da cidadania, da pesquisa e da educação a partir de uma perspectiva plural e diversa sobre o passado, o presente e o futuro.

Aberto ao público em 2009, o museu é um lugar de memória dedicado a preserva a história do prédio onde operou entre 1940 e 1983 o Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops/SP), uma das polícias políticas mais truculentas da história do país.

Por meio de exposições temáticas de grande impacto social, ações educativas, atividades para pessoas com deficiência e programações culturais gratuitas, o museu se consolidou como referência em Educação em Direitos Humanos, promovendo o pensamento crítico e desenvolvendo atividades sobre Direitos Humanos, Repressão, Resistência e Patrimônio.

Serviço:

Abertura: 7 de setembro de 2024

Memorial da Resistência: Largo General Osório, 66 Santa Ifigênia, São Paulo, SP

Telefone: 55 (11) 3335-5910

Entrada gratuita

Aberto de quarta a segunda (fechado às terças), das 10h às 18h.

(Fonte: Com Juliana Victorino/Agência Jacarandá)