Cães domésticos podem ser considerados espécies invasoras em sistemas agroflorestais de preservação, como as cabrucas — áreas em que o cacau é plantado à sombra de árvores nativas—, de forma que, se não forem bem cuidados, apresentam riscos à fauna local. A falta de administração adequada de vermífugos e vacinas e de outros cuidados responsáveis propicia o desenvolvimento de doenças que podem prejudicar o ambiente. A conclusão é de pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), da Universidade Federal do Piauí (UFPI), do Centro de Pesquisa e Conservação do Zoológico da Antuérpia, na Bélgica, e do Instituto de Medicina da Conservação do Zoológico de Saint Louis, nos Estados Unidos. O estudo está publicado na edição de sexta-feira (8) da “Revista Pesquisa Veterinária Brasileira”.
O objetivo do estudo foi verificar a presença dos cães e vermes parasitas nas proximidades da Reserva Biológica de Una (REBIO-Una) e do Parque Nacional da Serra das Lontras, em Una, Bahia, ambas áreas protegidas. Foram então analisados, nestes locais, 32 cachorros que vivem no mesmo ambiente de animais silvestres. Os autores apontam que, além de observar helmintos (vermes) nestes animais, 9 entre 10 defecavam na floresta ou em sistemas agroflorestais de cacau, apenas 33% foram vermifugados periodicamente e 64% foram vacinados contra a raiva em menos de doze meses.
As pesquisadoras instalaram armadilhas fotográficas em oito sistemas agroflorestais de cacau no sul da Bahia. Utilizando alimentos como isca, foram capturadas 539 fotos de 12 mamíferos, 15% dos quais foram de cães domésticos. Foi realizada pesquisa parasitológica em 32 dos 39 cães que viviam nas cabrucas, analisando suas fezes, assim como foram avaliadas a vacinação e a alimentação dos animais. Como a maioria dos cães (90%) defeca na floresta ou no sistema agroflorestal, há risco de contaminação dos animais silvestres, além do risco de contaminação do dono e de outros seres humanos.
“É comum as pessoas pensarem que fauna silvestre é que pode trazer algo ruim para a cidade, quando, na verdade, temos muito esta relação contrária. A gente nunca para e pensa que o cachorro doméstico também é uma espécie invasora e que está sendo introduzido em uma área onde já tinha toda uma fauna vivente ali”, afirma a autora principal do estudo, Sandy Kelly da Silva, mestranda no Programa de Pós-Graduação em Saúde Animal na Amazônia (PPGSAAM) da UFPA.
Outras linhas de pesquisa seguem em andamento. Lilian Catenacci, professora e pesquisadora do PPGSAAM e coautora da pesquisa, menciona o estudo de lugares estratégicos, como hotspots (áreas com grande diversidade de espécies em risco de extinção) e locais turísticos. Silva lembra do estudo para além da contaminação por parasitas, envolvendo também bactérias e vírus: “A gente fecha aí toda uma linha de saúde única, de pensar sempre na questão da saúde humana, animal e meio ambiente. Tudo em conjunto”.
(Fonte: Agência Bori)