O consumo de energia no transporte rodoviário pelas principais economias emergentes, representadas pelo Brasil, China, Índia, Indonésia, México e África do Sul, quase dobrou em 21 anos, segundo relatório da Agência Internacional de Energia (IEA na sigla em inglês), e aumentou de 14% em 2000 para 27% em 2021. O número total de veículos cresceu cinco vezes no mesmo período nesses países, eram cerca de 185 milhões de unidades em
2000 e, no final de 2021, somavam 1 bilhão de automóveis. A descarbonização no setor de transportes rodoviários é tema fundamental no Dia Mundial Sem Carro deste ano, celebrado em 22 de setembro.
O mais recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) aponta que, em mais de 50% dos cenários analisados, a temperatura média global vai atingir ou ultrapassar 1,5°C entre 2021 e 2040 e, em uma perspectiva mais extremista, poderia aumentar até 5,7°C até 2100, considerando-se o período pré-industrial.
O coordenador pedagógico do Movimento Circular e doutor em Educação e Sustentabilidade Edson Grandisoli lembra que o setor de energia responde por cerca de 75% das emissões globais de gases do efeito estufa (GEE) e apenas o setor de transporte corresponde a cerca de 20% das emissões. Ele reforça que a descarbonização e a mobilidade sustentável são temas urgentes no Dia Mundial Sem Carro.
O Dia Mundial Sem Carro é uma data celebrada em todo o mundo e tem como objetivo, em especial, provocar a reflexão sobre o uso excessivo do automóvel e os impactos do transporte sobre o ambiente e a vida das pessoas. O tema está diretamente relacionado à circularidade e à sustentabilidade. “Olhando para as ideias e preceitos da economia circular, nota-se um ponto fundamental ligado à redução das emissões de GEE: mudança da matriz energética global valorizando formas de energia mais limpas e sustentáveis. Isso vale tanto para o setor produtivo quanto de transporte”, afirma o coordenador do Movimento Circular.
Segundo Grandisoli, em um cenário ideal é preciso implementar caminhos e alternativas para tornar as atividades humanas net zero (estado de emissões líquidas zero de dióxido de carbono). Isso implica reduzir drasticamente o uso de derivados de petróleo como combustível. Embora tornar o setor de transporte net zero não resolva a questão climática de maneira definitiva, é um ponto fundamental de mudança dentro de um conjunto de outras práticas, aponta.
De acordo com o coordenador do Movimento Circular, ações já estão sendo adotadas rumo à descarbonização do setor de transportes, como a valorização dos biocombustíveis, do hidrogênio, o uso de carros elétricos, do transporte coletivo, a redução da distância dos deslocamentos e o uso de transporte não motorizado. “Essas iniciativas, associadas a políticas públicas de incentivo, financiamentos e campanhas de educação, formam um conjunto robusto de ações que estão sendo implementadas em diferentes escalas no Brasil e no mundo, mas ainda de maneira muito tímida”, aponta.
Grandisoli acrescenta que mudanças no desenho urbano também favorecem ações em mobilidade. Segundo ele, para alcançar o objetivo de reduzir as emissões de GEE, essas mudanças são urgentes e inadiáveis. “Já estamos vivendo as consequências da mudança do clima. Isso se reflete, inclusive, no uso do termo emergência ou crise climática”, alega. O mais recente Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) indica uma série de consequências do aumento da temperatura média do planeta.
Ameaças
De acordo com o documento, houve um aumento das concentrações de CO2 sem precedentes considerando-se os últimos dois milhões de anos; a última década foi mais quente do que qualquer período nos últimos 125 mil anos, o nível do mar aumentou mais rápido do que em qualquer século nos últimos 3 mil anos e a cobertura de gelo no verão do Ártico é a menor dos últimos mil anos. O relatório afirma que cada fração de grau de aumento das temperaturas intensifica essas ameaças e, mesmo o limite de 1,5°C, não é um cenário seguro para todos.
Com esse nível de aquecimento, mostra o documento, 950 milhões de pessoas no mundo enfrentarão estresse hídrico, estresse térmico e desertificação, e 24% da população estarão expostos a inundações. Grandisoli avalia que as medidas de adaptação e mitigação ainda são lentas frente à urgência das mudanças do clima e aumento na frequência e intensidade de eventos extremos. Mas avalia que o mundo vive um período de transição, com ações pensadas e executadas por diferentes países. “Líderes mundiais, empresas e cidadãos precisam compreender seu papel na mudança e agir pensando no bem-estar coletivo e nos impactos que populações mais vulneráveis já estão sofrendo. Acredito que já temos ótimas opções disponíveis. Elas precisam ganhar adeptos e escala. Para isso, precisamos mudar o paradigma atual focado nas fontes carbônicas para outros não emissores. Para isso, são necessários investimentos, estímulos à indústria e aos consumidores, educação e muita vontade política”, defende o coordenador do Movimento Circular.
Grandisoli avalia que a mudança também precisa partir das pessoas. Todo cidadão pode contribuir para a descarbonização do setor de transportes começando a adotar medidas possíveis como optar por caminhadas e uso da bicicleta, trabalhar em casa, usar o transporte público, dar caronas e escolher combustíveis menos poluentes. “Votar em políticos que possuem compromisso com a descarbonização e comprar de empresas que possuem compromissos sérios com a pauta climática também contribuem”, diz.
O exemplo de Noronha
Fernando de Noronha busca se tornar referência nacional em sustentabilidade e pretende ser a primeira localidade com carbono neutro do país. O Programa Noronha Carbono Zero (NCZ) prevê que, até 2030, será proibida a entrada na ilha de veículos que emitem dióxido de carbono, movidos a gasolina, álcool e diesel e, até 2050, o arquipélago quer neutralizar todas as emissões de gases de efeito estufa.
Segundo o governo estadual de Pernambuco, cerca de 55% das emissões de GEE da ilha são de aeronaves de transporte para o continente, 30% são da usina termelétrica e 10% dos transportes terrestres. Uma das duas empresas aéreas que atendem a ilha já iniciou um projeto de neutralização de carbono. A substituição da termelétrica por usinas solares é outro projeto em andamento em Fernando de Noronha, assim como a proibição do trânsito de veículos poluentes.
Tendências
A mobilidade sustentável e a descarbonização do transporte são temas de debates em toda discussão sobre o desafio das emissões zero. Algumas tendências são apontadas em diferentes estudos sobre o assunto. Uma delas são os serviços de mobilidade ou micromobilidade compartilhada por aplicativos, como carsharing, motosharing e bikesharing, em combinação com o transporte público, o Mobility as a Service (MaaS), para reduzir o uso de veículos particulares.
Outra tendência é a mobilidade conectada, com o uso de tecnologias para o planejamento de rotas e a comunicação entre os elementos de trânsito, de veículos a semáforos e vagas de estacionamento. Planejamento urbano e políticas públicas para controlar o uso de veículos pessoais também entram na cota de novas tendências de descarbonização do transporte, assim como estimular o uso de bicicletas, inclusive para o transportes do e-commerce e o bikesharing.
Sobre o Movimento Circular | Criado em 2020, o Movimento Circular é um ecossistema colaborativo que se empenha em incentivar a transição da economia linear para a circular. A ideia de que todo recurso pode ser reaproveitado e transformado é o mote da Economia Circular, conceito-base do movimento. O Movimento Circular é uma iniciativa aberta que promove espaços colaborativos com o objetivo de informar as pessoas e instituições de que um futuro sem lixo é possível a partir da educação e cultura, da adoção de novos comportamentos, da inclusão e do desenvolvimento de novos processos, produtos e atitudes.
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(Fonte: Betini Comunicação)