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Autor de um dos livros mais aterrorizantes de 2020 confessa seus medos

Brasil, por Kleber Patricio

Jorge Alexandre Moreira coloca o mistério e os questionamentos que permeiam sua mente desde criança nas histórias de terror que cria. Foto: divulgação.

Jorge Alexandre Moreira começou a escrever aos 12 anos e nunca mais parou. Lançou seu primeiro livro de forma independente, em 2003, quando essa não era uma prática comum no mercado. Este ano, lançou o romance Numezu, que foi um dos 10 finalistas do Prêmio Jabuti, um dos mais importantes do país. Foi a primeira vez que um livro de terror constou da lista. E parece ser só o começo dessa trajetória.

Seu primeiro livro, Escuridão, um terror ambientado na Amazônia, com um conflito entre Brasil e EUA como pano de fundo, foi considerado por diversos sites como um dos melhores livros do gênero já publicados no Brasil. Para levá-lo às livrarias, Jorge fez um trabalho de formiguinha. “Eu achava que o pior era publicar, mas eu não tinha ideia do quanto era difícil distribuir um livro. Quase não se comprava pela internet naquela época. Eu ia de porta em porta, oferecendo nas livrarias. Apesar da trabalheira, considero que foi um sucesso, pois consegui colocar o livro em mais de 20 livrarias. Acho que o tema ajuda muito. A Amazônia evoca uma aura de mistério, de lendas, de seres desconhecidos. Ao mesmo tempo, essa possibilidade de uma invasão de países estrangeiros é algo que sempre está na mente do brasileiro.”

Leitor voraz desde os primórdios da infância, se diz devoto de Stephen King, Jorge Amado, Clive Barker e Rubem Fonseca. Em 2018, lançou Parada Rápida, um thriller sobre o desaparecimento de uma mulher em um posto de gasolina, durante uma viagem.

Para Jorge, escrever foi algo orgânico, natural. “Eu lia boas histórias e tinha vontade de escrever daquele jeito. Não houve um momento em que eu respirei fundo e falei, ‘vou escrever um livro’. Eu comecei escrevendo histórias de uma ou duas páginas em folhas de caderno, elas foram virando histórias de dez ou 15 páginas e seguiram aumentando, em tamanho e complexidade”. Sobre escrever terror, o autor confessa que seus medos ajudam: “Aquilo de que você tem medo sempre é um bom ingrediente para a trama. Eu comecei tendo medo de monstros, de vampiros, de alienígenas. Quanto mais o tempo passa, cada vez eu tenho mais medo é das pessoas. Com exceção dos ETs. Até hoje morro de medo de ETs.”

Segundo ele, o terror provoca emoções fortes e questionamentos profundos, especialmente sobre a alma humana: “Além do componente de mistério, que sempre me cativou, desde criança, eu gosto de fazer as pessoas se perguntarem sobre as outras e sobre si mesmas. O bom livro de terror incomodará o hipócrita”. Jorge Alexandre Moreira participou das duas edições do Ghost Story Challenge, um evento em que escritores de terror passam um final de semana isolados, participando de oficinas de escrita, interagindo e escrevendo contos.  Desses dois eventos, nasceram as antologias Confinados e Numa Floresta Sombria, nas quais Jorge participou.

Seu lançamento deste ano, Numezu, já está sendo consagrado pela crítica e pelos leitores do gênero. Para 2021, o escritor promete novidades: “Eu nunca falo sobre o que estou escrevendo, mas posso adiantar que já tenho algumas coisas muito boas na manga, que só precisam de revisão, e umas outras que ainda estão na cabeça, mas que acho que vão ficar muito boas. Vamos ver”.

Sobre Numezu

Mais do que um livro de terror, Numezu é um mergulho nas sombras do comportamento humano. A história traz Laura e Raoul, um casal em crise, isolado num barco e que encontra uma antiga estatueta – a imagem de uma entidade perversa, ardilosa, que manipula as fragilidades humanas para conseguir liberdade. Agora, os fantasmas pessoais, desejos secretos e disputas de poder que já assombravam Laura e Raoul ganharão um componente violento e sombrio.

Sexo, violência, drogas, terror. Numezu é um livro tenso, claustrofóbico, não destinado aos estômagos fracos. Mesmo transitando pelo sobrenatural, ele não nos deixa esquecer que os piores monstros são humanos. Uma leitura de tirar o fôlego, do começo ao fim.

Numezu – Monomito Editorial

Onde comprar: https://www.amazon.com.br/Numezu-Jorge-Alexandre-Moreira/dp/6580505079

Valores: R$24,90 (físico) e R$9,90 (e-book com conto inédito Águas Mortas).

Seis em dez casos de intoxicação por agrotóxicos no RS acontecem em casa

Rio Grande do Sul, por Kleber Patricio

Foto: Ibadah Mimpi/Unsplash.

Pesquisadoras da Escola de Saúde Pública e do Centro Estadual de Vigilância em Saúde, em Porto Alegre, ao analisar 3.122 casos suspeitos de intoxicação por agrotóxicos notificados no Rio Grande do Sul entre 2011 e 2018 mostram que o cenário mais comum de contaminação acontece de forma acidental, em 40% dos casos e na própria residência do trabalhador, em 59% dos casos. Seis em cada dez casos notificados estão relacionados à produção agrícola do estado. O estudo foi publicado em 7 de dezembro na revista Epidemiologia e Serviços de Saúde.

Na maioria dos casos, as notificações foram de homens (63,7%), brancos (86,9%) com baixo nível de escolaridade. Apenas 4,3% haviam cursado ou completado o ensino superior. Embora a faixa etária mais atingida tenha sido de 20 a 29 anos (20,3%), a maioria (60,6%) das intoxicações suspeitas foi notificada a partir dos 30 anos. Em 82% dos casos, a intoxicação foi do tipo aguda, quando há apenas um evento de exposição do indivíduo à substância tóxica em 24 horas. O diagnóstico da intoxicação foi feito por meio de avaliação clínica em 61% dos casos notificados.

O fato de quase seis entre dez notificações terem ocorrido por contato na própria residência, superando o ambiente de trabalho (33,7), não surpreendeu as autoras. “Esse dado levanta as hipóteses da existência de problemas no armazenamento e de descumprimento da distância mínima recomendada entre a lavoura e a casa. Além disso, no ambiente domiciliar se utilizam também inseticidas, raticidas e produtos destinados ao tratamento de piolhos e outros parasitas, aumentando ainda mais o risco de intoxicação”, observa a sanitarista da Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul Amanda Brito de Freitas, que assina a autoria do estudo ao lado da sanitarista Vanda Garibotti.

Como evitar intoxicações

A contaminação acidental (40%) foi o principal motivo de intoxicação. Mais do que isso, registrou o dobro da contaminação por uso habitual (20%) e supera também o uso ambiental e tentativa de suicídio. As principais motivações associadas com esses acidentes são o armazenamento em local de fácil acesso, manejo inadequado destas substâncias (incluindo também a reutilização das embalagens) e falta de equipamento de proteção individual (EPI).

A orientação técnica e a fiscalização nestes casos são fundamentais para evitar os riscos à segurança e à saúde dos trabalhadores rurais. Na agricultura, explica Amanda Freitas, o objetivo do uso do EPI é evitar os riscos químicos que podem levar às intoxicações de forma aguda e crônica em decorrência da utilização de agrotóxicos. As atividades de pulverização (42%) e diluição (18%) foram as de maior exposição ao agrotóxico. “É importante que o empregador proporcione capacitação aos trabalhadores com orientação quanto ao risco à saúde inerente à utilização desses produtos, quanto aos locais adequados de armazenamento e forma correta de manuseio e aplicação, de acordo com os rótulos e as bulas do fabricante; assim como o uso correto da vestimenta adequada, incluindo calças e camisas compridas, que cubram toda a pele, botas, luvas, avental, óculos de segurança ou viseira de proteção, chapéu ou capuz com máscara. Além disso, é importante orientar também sobre as recomendações quanto à manutenção, lavagem, descarte e armazenamento destes EPIs”, detalha.

As autoras vislumbram que o estudo seja utilizado como subsídio para o planejamento das ações da vigilância em saúde e políticas púbicas para a proteção da saúde da população. Elas também concluem que é necessário avançar na identificação dos casos de intoxicação por meio do desenvolvimento de novos métodos diagnósticos a partir de biomarcadores e melhor qualidade da coleta de dados.

(Fonte: Agência Bori)

Curso gratuito ensina a estimular gosto pela literatura em crianças

Indaiatuba, por Kleber Patricio

Imagem de press 👍 and ⭐ por Pixabay.

Como estimular o gosto pela literatura em crianças, ainda mais numa era em que as ferramentas tecnológicas oferecem tantas atrações e distrações? A psicóloga e consultora educacional Carla Jarlicht realiza no próximo dia 10 de dezembro, às 18h, um encontro virtual gratuito sobre como despertar o interesse pela leitura, tendo em vista a escolha de títulos que, por sua qualidade literária, podem ajudar a seduzir novos leitores. “De forma dinâmica, clara e com muitas sugestões, faremos uma introdução sobre a qualidade em livros para crianças e a formação do leitor com gosto pela literatura. Quando o educador conhece com mais profundidade o que a literatura para crianças tem a oferecer, ele consegue encontrar maneiras mais criativas, instigantes e sensíveis de engajar a meninada na leitura”, explica Jarlicht, especialista em Literatura para Crianças (UFRJ) e Mestre em Educação (PUC-RJ).

A inscrição pode ser feita por meio do link https://www.sympla.com.br/literatura-para-criancas-o-que-e-preciso-para-escolher-livros-interessantes__1065217?fbclid=IwAR2fmyivirW8wVmXaoBmGhaG5bi1zeIN2YlviZltU6YyV_JZ4wxx4siL9PY. Abaixo, segue entrevista em que Carla Jarlicht fala sobre a importância de estimular a leitura entre as crianças e o papel central que pais e professores têm neste processo.

Existe alguma fórmula para despertar o interesse da leitura em qualquer criança ou isso varia de caso a caso?

Não há fórmula. Há formas, as mais variadas, de sensibilizar e instigar as crianças para a leitura. Há infinitas formas, porque variadas são as pessoas, seus gostos, interesses e disponibilidades. Porém, há que se ter paciência, resiliência e um interesse genuíno para descobrir o que o outro gosta ou ainda descobrir junto com o outro. Nesse trabalho olho no olho é preciso ouvir a criança, coisa que o adulto não tem por costume. Para despertar o interesse pela leitura, é importante também experimentar diferentes tipos de livros, diferentes enredos, projetos gráficos e ilustrações; conhecer diferentes escritores e ilustradores. Podem-se combinar mais idas aos espaços que convidem à leitura, como bibliotecas e livrarias ou ainda o teatro e cinema, que possibilitam outros desdobramentos. Pode-se começar pelos clássicos ou pelos contemporâneos ou por aquele que já foi adaptado para filme ou virou jogo, não importa. O que faz a diferença é ir buscando conexões com a criança de forma interessada e fazendo da leitura um momento de aconchego, de troca de experiências.

Qual a importância dos pais e dos professores na transformação da criança em parte do público leitor?

É inegável que pais e professores têm um papel bastante importante, tanto como exemplos quanto como provocadores. Digo isso porque talvez não adiante muito os pais dizerem que ler é bom ou importante se a criança não os vê em nenhum momento lendo, se aquela atividade não faz parte da rotina. Então, se a leitura faz parte da vida da família, ou seja, se a leitura é considerada e vivida como um valor, há mais chance da criança ficar curiosa, encantar-se por leitura e tornar-se leitor. É fundamental que o discurso esteja alinhado com a prática porque a criança não é tola.

O mesmo vale para o professor. Por mais desafiadora que seja a rotina da sala de aula (e ela é muito) é fundamental que a leitura ocupe um lugar nobre no dia; não pode ser limitada aos minutos finais da aula. E por leitura aqui falo dos livros literários, porque todos os outros tipos de texto já estão, em alguma medida, presentes em qualquer planejamento. É importante também que o professor seja leitor, que essa atividade faça parte da sua vida e que traga para os alunos propostas instigantes.

Vale dizer que pais e professores têm a grande vantagem de conhecer a criança, seus gostos e interesses, o que pode facilitar muito na hora de apresentar algum livro e estimular o engajamento da criança.

Atualmente e muito por causa das restrições de convívio, jogos eletrônicos, celulares e TV são as principais companhias das crianças em casa. Há espaço para os livros? É necessário estipular regras e horários para o equilíbrio entre eletrônicos e leitura?

É preciso observar a qualidade e da quantidade dessa exposição das crianças às telas e também avaliar a relação que as crianças estabelecem com elas. Sobre esse tema, a Sociedade Brasileira de Pediatria já se posicionou, alertando veementemente quanto ao uso dos eletrônicos pelas crianças e fez recomendações importantes. É preciso dosar sim e diversificar as atividades em casa (e na natureza, quando puder), oferecendo às crianças outras alternativas, principalmente nesse momento em que estamos mais restritos.

Em qualquer tempo, a leitura é uma atividade lúdica espetacular, pois oferece à criança a possibilidade de elaborar suas questões, articulando a narrativa com seus próprios conteúdos internos e, assim, ressignificar o mundo. Por conta disso, a leitura também ajuda a criança a modular o estresse, aspecto que, no contexto atual, é bastante relevante.

No entanto, mesmo entendendo que há espaço para tanto para eletrônicos quanto para os livros, é preciso sim que o adulto ajude a criança a organizar a sua rotina, encontrando equilíbrio entre suas atividades e estabelecendo prioridades juntos. Convém lembrar que os joguinhos eletrônicos não costumam prescindir de mediação, ao passo que o livro, muitas vezes, sim. E isso é muito bacana. O que pode parecer uma desvantagem, na verdade podemos encarar como uma grande oportunidade, um convite ao encontro. É isso que a leitura provoca, encontros do leitor consigo mesmo e com o outro e assim, a possibilidade de aproximação e estreitamento de laços – o que vale cada minuto desse investimento, principalmente, quando falamos da relação entre pais e filhos.

Há uma idade limite para a iniciação à leitura? A criança que passou a primeira infância sem ler ou lendo pouco pode ser resgatada?

Limite é uma palavra que não combina com leitura. Claro que podemos e devemos estimular a leitura das crianças desde o começo da vida, desde bebês. Aliás, esse é um nicho da literatura para bebês tem crescido bastante. Os pequenos têm muita curiosidade, gostam da interação com o livro (e com aquele que lê com ele, claro), estão atentos às imagens, aos ritmos das palavras, ávidos por esse mundo que estão conhecendo. Portanto, é para investir nisso sim (e já existe muita produção de qualidade disponível), pois a criança vai se familiarizando com a leitura desde cedo e essa atividade vai se constituindo como algo prazeroso, acolhedor e orgânico. Mas se por acaso a criança não apresenta pela leitura um grande interesse, isso não é razão para o adulto desmobilizar ou desinvestir seus esforços; muito pelo contrário. Como disse antes, formar leitores é um processo que se dá com convites persistentes e interessados, oferecendo-se diferentes opções para que a criança possa ir descobrindo o que gosta, o que não gosta, para ir tomando gosto. E há de tudo. Às vezes, a criança lia bastante durante uma fase da vida e, depois, deixa a leitura um pouco de lado; outras vezes, a pessoa desperta para a leitura assim como que de repente, na adolescência, porque assistiu um filme e quis ler o livro e acabou fascinada pelo escritor – muitas são as possibilidades. E, mais uma vez, não há regras e, muito menos, finais irreversíveis. Como educadores, precisamos nos questionar e ter um olhar e uma escuta mais atentos para poder fazer convites mais certeiros.

Série Dança em Casa com SESC recebe espetáculos “Ensaios para desaparecer – envultações” (8/12) e “Entre o corpo e o azul” (10/12)

São Paulo, por Kleber Patricio

Crédito das fotos: Clarissa Lambert.

No ar há cinco meses, a programação da série Dança em Casa com SESC dá início ao último mês do ano, com a transmissão dos espetáculos direto das unidades do SESC na capital paulista, intercalados com lives realizadas na casa dos artistas ou em estúdios de trabalho, sem a presença de público no local e seguindo todos os protocolos de segurança. O modelo híbrido, implementado em outubro, faz parte da retomada parcial e gradativa das atividades do SESC, permitindo o encontro com artistas de outros estados ou pertencentes ao grupo de risco do coronavírus. Ao mesmo tempo, estimula o setor cultural ao abrir os palcos de suas unidades.

Na terça-feira (8/12), Leonardo França e Alana Falcão apresentam a montagem Ensaios Para Desaparecer – Envultações diretamente de Salvador (BA). O trabalho, desdobramento das pesquisas dos dois artistas, é um projeto de múltiplas naturezas que acontece em foto, vídeo e texto, aumentando as associações entre dança e mitologia. Os dançarinos criam micromitologias coreográficas a partir dos conceitos de “desaparecimento” e “envultações”, apostando assim numa atmosfera de mistério que realça a vida das coisas que nos cercam, partindo do pressuposto de que todo espaço doméstico nunca está totalmente domesticado. Classificação: 14 anos.

Quinta-feira (10/12), é a vez da Cia. Jovem de Dança de Jundiaí mostrar Entre O Corpo e O Azul direto do palco do SESC 24 de Maio. O limite foi a premissa para nortear a obra, que conta com coreografia de Henrique Rodovalho e direção de Alex Soares. Onde começa o corpo e termina no movimento? Onde este movimento começa e finaliza no espaço? A partir dessas e outras perguntas, um corpo que se movimenta, se expressa e acontece em espaços delimitados foi se desenvolvendo. Com trilha sonora que inclui trechos de músicas da cantora e compositora Alcione, surgem relações e percepções mais humanas e sensíveis, expondo as possibilidades do acontecer e do fazer sentir entre o corpo, o movimento, o espaço e o azul. Com Bruna Vicente, Caroline Rodrigues, Daniela Corrêa, Fernando Ramos, Jonatas Santana, Lucas Pardin, Luiz Prestes e Raquel Gattermeier. Classificação: 14 anos.

DANÇA #EMCASACOMSESC

A série de apresentações de dança do SESC São Paulo na internet está no ar desde 25 de junho, com importantes nomes da dança nacional, de diferentes vertentes. Com transmissões às terças e quintas, às 21h, direto da casa dos artistas ou de palcos das unidades, a programação já realizou 47 apresentações que somam mais de 84 mil visualizações. Muitos destes espetáculos permanecem disponíveis no YouTube do SESC São Paulo (@SESCsp).

Assista: youtube.com/SESCsp  instagram.com/SESCaovivo.

Sonhos da pandemia refletem sofrimento mental e medo do contágio da Covid-19, aponta estudo

Brasil, por Kleber Patricio

Foto: Gregory Pappas/Unsplash.

A pandemia, ocasionada pelo novo coronavírus, mudou a rotina de todo o mundo. A paralisação das atividades, o distanciamento social e as muitas preocupações advindas dessa nova ordem mundial afetaram diretamente o psicológico das populações que ainda não sabem como lidar com o medo de contrair a Covid-19 ou, ainda, de perder alguém próximo por causa dessa doença. Pesquisa desenvolvida pelo Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (ICe/UFRN), publicada na Plos One no último dia 30, mostra que essa preocupação também está afetando os sonhos das pessoas.

Desenvolvido por um grupo de 13 pesquisadores sob supervisão da psiquiatra e neurocientista Natalia Mota, o estudo mostra que os sonhos do período pandêmico são diferentes dos relatos dos sonhos anteriores à pandemia. Os pesquisadores perceberam que os sonhos nesse período têm maior proporção de palavras ligadas à “raiva” e à “tristeza” e maior semelhança a termos como “contaminação” e “limpeza”. Esses resultados corroboram a hipótese de que os sonhos pandêmicos refletem sofrimento mental, medo do contágio e mudanças importantes no cotidiano, hábitos que impactam diretamente a socialização.

Segundo a pesquisa, essas características parecem estar associadas ao sofrimento mental ligado a isolamento social, pois explicaram 40% da variância na subescala negativa, relacionado à socialização, de PANSS (Escala de Síndrome Positiva e Negativa), usada para medir a gravidade dos sintomas de pacientes com esquizofrenia.

Ao todo, 67 pessoas participaram das duas fases do estudo – antes e durante a pandemia de Covid-19. A aquisição de dados foi feita por um aplicativo para smartphone, chamado de InterviewerApp, desenvolvido pelo grupo para coletar relatos de memória de forma segura e remota. A aplicação executa uma rotina que captura os relatos dos participantes, os salva em arquivos de áudio e depois os envia para um servidor do Instituto do Cérebro, de onde são acessados pelos pesquisadores. Foram utilizadas ainda ferramentas computacionais que medem a proporção de palavras emocionais as comparando a uma lista pré-estabelecida e já validada para calcular a proporção de conteúdo emocional. Depois, os pesquisadores criaram um mapa entre palavras constituindo a localização de cada vocábulo a partir da frequência de ocorrência das palavras nos mesmos contextos.

A pesquisa mostra que as mudanças nos sonhos estavam associadas ao grau de sofrimento mental experimentado pelos voluntários, principalmente com maior dificuldade em manter relações sociais satisfatórias com as medidas de isolamento social. “Dessa maneira, percebemos os sonhos como importante espelho desse mundo interno, demonstrando serem importante fonte de autoconhecimento” disse Natalia Mota.

Natalia esclarece ainda que, como os principais resultados foram encontrados justamente no grupo de indivíduos que não relataram sofrimento mental previamente, é possível afirmar que o acompanhamento atento dos próprios sonhos, principalmente em momentos de estresse agudo, pode ser uma boa fonte de alerta de sofrimento mental, pois ajuda a advertir sobre riscos. “Ao final, também podemos perceber que os voluntários auto-avaliaram o processo de observar e compartilhar os sonhos como benéfico, trazendo mais sentimentos como felicidade, altruísmo e criatividade para o seu cotidiano”, completa.

Sonho e realidade

De acordo com Natalia Mota, recentes teorias das neurociências atribuem ao sonhar uma função de regulação de emoções. Seria um mecanismo análogo à digestão, nesse caso, de memórias. Esse processo extrai das lembranças do cotidiano o aprendizado para ser retido, mas atenua as emoções, principalmente as muito negativas, nos permitindo lembrar do evento sem sofrer, como se estivesse acontecendo naquele momento, o que ajuda a superar traumas. Outras teorias observam o papel dos sonhos como um centro de realidade virtual personalizado com suas próprias memórias, oportunizando treino específico e seguro para ameaças prováveis do dia seguinte. Da mesma forma, os sonhos funcionariam também como um simulador para treinar habilidades sociais, haja vista a grande importância da socialização para a nossa espécie.

(Fonte: Agência Bori)