Apesar de as oportunidades de trabalho em Tecnologia da Informação no Brasil continuarem crescendo, o Distrito Federal, a Bahia, Pernambuco e o Ceará somam, juntos, apenas 11% das vagas, de acordo com o Panorama de Talentos em Tecnologia, do Google for Startups. De acordo com o Banco Nacional de Empregos, as vagas em TI aumentaram 79,6% de janeiro a outubro de 2023 em relação ao mesmo período do ano anterior. No entanto, a maioria delas está no Sudeste, que abarca 62% das oportunidades, com 44% delas dentro do estado de São Paulo.
Para além da área de Tecnologia, o Norte e o Nordeste levam consigo outras particularidades: no quarto trimestre de 2023, o Norte fechou com taxa de desocupação de 7,7% e o Nordeste, 10,4%, porcentagem considerada estável para a região. Os maiores números foram registrados no Amapá (14,2%), na Bahia (12,7%) e em Pernambuco (11,9%). No entanto, em 2023, a taxa média de desemprego no Brasil foi de 7,8%, o menor número desde 2014. Além disso, as maiores taxas de informalidade estão no Maranhão (56,5%), no Pará (56,5%) e no Piauí (54,4%), sendo que a média nacional foi de 39,2% no ano passado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Outro dado que ajuda a explicar essa disparidade é o Índice de Capital Humano, um número proposto pelo Banco Mundial que mede o potencial econômico e profissional dos cidadãos. Por meio dele, é possível perceber o quanto um país perde por não investir de maneira igualitária em educação e emprego, por exemplo. De acordo com o Relatório de Capital Humano Brasileiro, o ICH médio das regiões Norte e Nordeste em 2019 foi semelhante ao ICH médio das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste em 2007. Ou seja, existe uma lacuna regional de 12 anos a ser superada.
“Na área de Tecnologia, o principal fator que leva a esse fenômeno é o fato de que essas regiões têm menos empresas do setor, então elas não conseguem absorver toda a demanda. Além disso, a qualidade da educação de tecnologia pode variar significativamente entre as regiões do país e, quando a gente olha para o Norte e Nordeste, ainda não temos uma qualificação [que consiga abarcar a necessidade da área]. Nesse ponto, acredito que a falta de investimento em infraestrutura, tecnologia e comunicação possa dificultar o desenvolvimento e a expansão de empresas de TI nesses locais”, comenta Ana Letícia Lucca, CRO da Escola da Nuvem, uma organização sem fins lucrativos que visa capacitar e empregar pessoas em situação de vulnerabilidade social e econômica para carreiras em computação em nuvem a partir de certificação técnica e oportunidade de primeiro emprego por meio de empresas parceiras.
“A concentração das vagas de TI tende a estar em regiões mais desenvolvidas, como o Sudeste, e isso também leva a uma migração de talentos qualificados da região Norte para as regiões onde há mais oportunidades. Precisamos considerar ainda que pessoas em situações de vulnerabilidade social no Norte e Nordeste podem enfrentar barreiras adicionais para ingressar e progredir em carreiras de tecnologia, incluindo acesso limitado às redes profissionais, falta de apoio financeiro para educação e treinamento e discriminação no mercado de trabalho”. Segundo ela, a falta de vagas em TI nessas regiões contribui também para a perpetuação da desigualdade social e de renda, pois limita o acesso ao emprego e o desenvolvimento econômico para os residentes nesses locais.
Ela conta que, durante a pandemia, a região de residência dos candidatos não era tão decisiva para a colocação e recolocação dos profissionais, considerando a experiência obtida a partir dos alunos da Escola da Nuvem no mercado de trabalho, pois o modelo remoto era mais popular entre as empresas, o que não é mais tão comum. “Entre os motivos que levam as empresas a priorizarem o modelo presencial ou híbrido, está a necessidade de colaboração e inovação, pois as empresas acreditam que estes modelos de trabalho facilitam a criatividade, permitindo uma comunicação fácil e o compartilhamento de ideias entre as equipes. Para algumas organizações, o trabalho presencial é visto como essencial para manter o fortalecimento da cultura organizacional, para a supervisão e gestão de desempenho. Um outro ponto é em relação à segurança de dados e confidencialidade, pois as empresas se preocupam com algumas informações sensíveis no trabalho remoto, como de finanças e saúde, por exemplo”, explica Ana.
A especialista comenta também que a preferência por modelos de trabalho presenciais remotos ou híbridos pode variar significativamente entre empresas e setores. De acordo com o estudo Pesquisa de Tendências RH 2024, realizado pela Catho, 61% das empresas entrevistadas têm intenção de voltar ao trabalho presencial ao longo de 2024, porque muitos segmentos só podem atuar nessa modalidade ou porque o modelo presencial pode favorecer o engajamento e a cultura organizacional dos times. Em contrapartida, a pesquisa ‘Quais os sentimentos de quem voltou ao modelo presencial?’, mostrou que 64,4% dos entrevistados dizem sentir que a qualidade de vida piorou no retorno ao modelo presencial de trabalho.
Ana defende que, na área de Tecnologia, os modelos de trabalho remotos se estenderam por mais tempo. “As entregas tiveram resultados. E, do outro lado, principalmente nos grandes centros onde a estrutura de trânsito não é tão boa, como em São Paulo e no Rio de Janeiro, não podemos desconsiderar o desgaste que os profissionais têm ao se deslocarem. Acredito que em todas as frentes de trabalho, seja o modelo 100% online, 100% presencial ou híbrido, vamos ter ganhos e perdas, prós e contras. Então, é importante avaliar o que está alinhado com os valores da organização.”
Segundo Ana, a promoção mais equitativa de empregos em Tecnologia depende de medidas adotadas por empresas, órgãos governamentais e a sociedade em geral, como o investimento em educação e a expansão da infraestrutura de tecnologia no país. Ela comenta que, mais do que oferecer as vagas, as organizações também devem estar preparadas para receber os profissionais. “É necessário que o processo de contratação seja acessível e inclusivo para todos os candidatos, além de considerar os contextos sociais e econômicos de onde essas pessoas vêm. Ainda, investir em capacitação e desenvolvimento, porque não adianta ter um programa de diversidade e inclusão e não ter pessoas preparadas e sensibilizadas para trabalhar com esse assunto. Ao trabalhar em conjunto, podemos desempenhar um papel significativo na promoção de uma distribuição justa de emprego em tecnologia, contribuindo para reduzir as disparidades regionais e promover o desenvolvimento econômico inclusivo”, finaliza a especialista.
(Fonte: Mondoni Press)