Como podemos refletir sobre o lugar que a mídia ocupa nas configurações das representações de saúdes e doenças? Diante dos muitos desafios e debates levantados pela pandemia do novo coronavírus, a proliferação da cobertura midiática de saúde passou a assumir um papel de grande importância no cotidiano global. É nesse contexto que os pesquisadores Igor Sacramento e Wilson Couto Borges lançam o livro Representações Midiáticas da Saúde. Integrante da coleção Temas em Saúde da Editora Fiocruz, o livro está disponível para aquisição desde quarta (16), nos formatos impresso – via Livraria Virtual da Editora – e digital, por meio da plataforma SciELO Books.
Nos estudos analíticos presentes na obra, os autores contemplam questões do corpo que dialogam com a reconfiguração – causada pela pandemia – da ideia de fatores de risco. “A Covid-19 traz uma reinserção da noção de grupo de risco, classificando indivíduos, sujeitos e grupos sociais como aqueles que correm maior risco, como no caso dos idosos, pessoas com doenças cardiovasculares preexistentes e também pessoas obesas, que é um dos pontos da nossa análise nesse livro”, analisa Igor Sacramento.
Além da obesidade, o título propõe contribuições para demais dimensões das representações midiáticas da saúde, como as noções de corpo em forma, cirurgia bariátrica, a cultura do fitness e a dismorfia corporal (marcada pela insatisfação obsessiva de uma pessoa com seu próprio corpo). Pesquisadores e professores do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz), Sacramento e Borges apresentam, na obra, conceitos de representação e alguns de seus problemas.
Em orientações de pesquisas e participações em bancas de pós-graduação, os autores percebiam que os estudos das representações em geral (e particularmente das representações midiáticas) estavam constantemente associados ou a uma ideia de espelho – ou seja, de uma reflexão sobre a realidade – ou a uma ideia de distorção. “Mas é importante destacar que a representação é, sobretudo, um campo de disputas por poder, inclusive o poder de representar”, pondera Igor.
Dessa forma, os autores alertam que as simplificações causadas por dicotomias como verdadeiro x falso, original x cópia, correto x errado inviabilizam uma agenda de pesquisas que possa analisar o jogo de representações a partir de suas disputas e interesses. Para eles, não existe ser humano sem representação, já que a existência de cada um de nós é marcada por símbolos e pela linguagem.
Nesse contexto, Wilson Borges ressalta que, diante da centralidade que a comunicação ocupa nesse processo, é fundamental entendermos o que significa esse estudo das representações. Segundo o autor, são várias as pesquisas que mostram o quanto a comunicação é olhada pela lógica da saúde, mas que é possível ir além nas análises. “O que fazemos nesse trabalho é colocar a comunicação em diálogo com a saúde. Mostramos que a representação midiática sobre a saúde é o nosso foco, mas que a questão da representação transcende o campo da saúde. Ele vai atuar e vai interferir em todas as áreas da vida social”, defende.
As representações do corpo no jornal, na TV e no YouTube
Em cinco capítulos, o volume atravessa, de forma acessível e objetiva, diferentes momentos nas análises de representação. No início, eles propõem um “passeio teórico” sobre a noção de representação. Em seguida, investigam as construções discursivas de identidades e diferenças nas representações midiáticas sobre saúde e doença: o eu e o outro, o nós e o eles. Nos capítulos três, quatro e cinco são apresentadas análises mais específicas em torno das relações entre os discursos de promoção da saúde e as práticas de controle sobre as formas corporais.
Entram nessas abordagens diversas mídias: o veículo impresso, os programas de entrevistas e entretenimento de televisão, o YouTube. Entre os espaços analisados estão o jornal O Globo, Encontro com Fátima Bernardes, Programa da Eliana e entrevistas comandadas por Jô Soares, além de EuVejo, canal do YouTube que fala de problemas da relação com o corpo. “O que a gente busca destacar é qual o lugar da mídia na construção de efeitos não só simbólicos da representação, mas também na hierarquia e na definição de fatores e grupos associados a risco. E sobre essa demarcação de fronteiras entre aceitável e inaceitável, o normal e o patológico, o bom e o mau. Refletimos sobre o papel das várias mídias não só como ferramenta, mas especialmente como palco dos acontecimentos da vida contemporânea”, reflete Igor Sacramento.
A origem do livro dialoga com o nascimento do grupo de pesquisa coordenado pelos autores no Icict/Fiocruz: o Núcleo de Estudos em Comunicação, História e Saúde (Nechs). Segundo eles, Representações Midiáticas da Saúde é um dos resultados do projeto de pesquisa O Imperativo da Saúde: corpo, estilo de vida e performances de gênero na cultura da mídia (décadas de 1980/2010), que tem como objetivos analisar os processos de representação dos corpos em relação a ideais de saúde, boa forma e bem-estar. Em 2018, a pesquisa foi contemplada pelo edital universal do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que auxiliou o desenvolvimento dos estudos.
(Fonte: Agência Bori)