Quase todas (98,9%) as crianças com menos de dois anos em Cruzeiro do Sul (AC), a 600 quilômetros da capital Rio Branco, consomem alimentos ultraprocessados – produtos industriais com vários ingredientes, como sal, açúcares e aditivos, que aumentam o sabor e a durabilidade, porém ricos em calorias e pobres em nutrientes. A análise é de pesquisadoras das universidades federais do Acre (UFAC), de São Paulo (Unifesp) e de Pelotas (UFPel) e foi publicada na sexta (22) na ‘Revista de Nutrição’.
O estudo também chama a atenção para o alto consumo de bebidas açucaradas, como refrigerantes ou sucos em pó, ingeridas por 72,7% dessas crianças. Os resultados contrariam as recomendações do Ministério da Saúde, que alerta para o risco de obesidade, cânceres, cáries e diabetes relacionado ao consumo desses produtos. Crianças menores de dois anos devem ter uma alimentação baseada em alimentos frescos ou minimamente processados.
Através de entrevistas com as mães ou responsáveis durante as Campanhas Nacionais de Vacinação de 2016 e 2017, a equipe coletou dados sobre a alimentação de 688 crianças de até 24 meses nas 24 horas anteriores. A pesquisa identificou fatores associados ao consumo de alimentos ultraprocessados e bebidas açucaradas, como baixa escolaridade paterna, renda familiar menor que um salário mínimo, residência em zona rural e idade entre seis e onze meses.
A prevalência de consumo de alimentos ultraprocessados pelas crianças foi 2% maior do que em famílias com renda entre um e dois salários mínimos. Crianças que viviam em áreas rurais tiveram um consumo de bebidas açucaradas 21% maior do que aquelas que viviam em áreas urbanas. Já filhos de pais com ensino fundamental incompleto ou apenas ensino médio consumiram entre 42% e 55% mais bebidas açucaradas do que aqueles cujos pais tinham nível superior.
Para a pesquisadora da UFAC Vanizia Barbosa da Silva Maciel, uma das autoras do estudo, tais hábitos alimentares podem indicar uma falta de conscientização sobre o tema entre os responsáveis pelas crianças. Segundo a cientista, são necessárias intervenções em direção a uma alimentação saudável e à prevenção de possíveis efeitos futuros à saúde, como a obesidade infantil.
Os resultados acrescentam evidências sobre o padrão alimentar das crianças na Amazônia, apontando para a necessidade de considerar fatores socioeconômicos ao discutir hábitos alimentares. “Destaca-se neste estudo a inclusão de pesquisar o pai da criança, figura fundamental para provisão e influência na alimentação infantil, pois as pesquisas nacionais só inserem a mãe”, observa Maciel.
Outro diferencial da análise é a participação de pesquisadoras da Amazônia, segundo a autora. “Faz total diferença, pois as peculiaridades regionais são imensas e desafiadoras na construção do conhecimento e, consequentemente, nas propostas de mudança da alimentação infantil”, aponta. A equipe pretende seguir pesquisando as tendências alimentares entre as crianças acreanas.
(Fonte: Agência Bori)