O município de Tefé, no Amazonas (AM), é um polo de influência para municípios da região conhecida como Triângulo, sendo uma referência não somente em prestação de diversos serviços públicos, incluindo acesso à saúde pública. Apesar dessa centralidade, o município conta com pouca contribuição estadual de investimento em saúde e pode enfrentar uma situação de sobrecarga de pacientes devido a essa falta de planejamento. O diagnóstico é de pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de Manaus, publicada na revista científica “Saúde em Debate” no dia 29 de março.
O estudo descreve as articulações entre a atenção básica e a atenção especializada na região central do Amazonas a partir de dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e dos agravos da região a partir de bases do DataSUS, no período de 2015 a 2019. Os especialistas também realizaram entrevistas com gestores de saúde regionais em setembro de 2020 e abril de 2021 para tentar entender as dinâmicas políticas da rede de saúde.
Segundo revela o trabalho, o planejamento em saúde da região não leva em conta os fluxos de pacientes do território. Os pesquisadores também apontam que esse planejamento falha em estabelecer uma rede regional que descentralize o Sistema Único de Saúde (SUS). Para a pesquisadora coautora do estudo Michele Rocha El Kadri, da Fiocruz Amazônia, o trabalho contribui na discussão da política de regionalização adequada à realidade amazônica. “Neste planejamento, três aspectos merecem ser considerados: a grande extensão territorial, a dispersão da população e os fluxos fluviais do deslocamento dos usuários”.
As longas distâncias acabam sendo um dos desafios enfrentados pelo atendimento em saúde nesta região. Todos os municípios no entorno de Tefé são só acessíveis por via fluvial e o tempo desta locomoção depende da época de cheia ou seca dos rios. A distância entre Tefé e os demais municípios varia de 433 quilômetros (ou 10 horas e 47 minutos) a 32 quilômetros (ou 1 hora percorrida por lancha). Os pacientes com problemas de saúde mais urgentes são transportados por aeronaves à capital Manaus.
Segundo o trabalho, enquanto polos regionais como Tefé concentram equipamentos, profissionais e poder de decisão sobre o sistema de saúde, grande parte da extensão territorial dos municípios do interior do Amazonas permanece sem acesso a atendimento local e equipamentos de saúde. O acesso à saúde vai ficando mais restrito conforme o nível de complexidade da intervenção.
Além disso, outro ponto importante do estudo é levantar a questão da gestão tripartite na saúde entre governo federal, estados e municípios. Nesta região, o investimento em saúde acaba sendo subsidiado, na maior parte, pelo governo federal e pelo município de Tefé, que assume a responsabilidade de atender usuários de outros municípios. “É preciso definir melhor o papel de cada ente federativo quanto ao financiamento das ações de saúde e reforçar os serviços dos hospitais regionais para que não haja sobrecarga no atendimento”, finaliza El Kadri.
(Fonte: Agência Bori)